quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Análise: A Mulher de Preto

O filme de terror A Mulher de Preto, em cartaz nos cinemas do país, talvez atraia mais público pela presença de Daniel Radcliffe, famoso mundialmente por sua interpretação como Harry Potter, do que por sua história em si. O novo papel tem sido considerado pelos críticos - e pelo próprio Radcliffe - como um primeiro passo em um novo momento na carreira do ator. Na verdade, esse não é o primeiro papel de Radcliffe além da série Harry Potter, mas com o fim da saga do bruxo no cinema, A Mulher de Preto pode ser interpretado como um ponto de mudança em sua carreira. E o resultado é positivo. Se o filme dirigido por James Watkins, adaptado do romance da escritora inglesa Susan Hill e que ganhou recentemente uma versão em português, é tradicional ao extremo, chegando a ser até mesmo formulaico em alguns momentos, em geral consegue com competência cumprir seu objetivo de apresentar uma história de terror quase gótica, no mais tradicional esquema da casa mal-assombrada e com grandes doses de suspense psicológico.

Radcliffe é o jovem advogado Arthur Kipps, um homem extremamente atormentado com a morte de sua esposa no parto de seu filho. Quatro anos depois dessa tragédia, em algum momento do começo do século XX, Arthur ainda está juntando os cacos de sua vida quando é convocado por seu chefe para organizar a papelada de uma cliente, moradora de uma cidade do interior, que faleceu recentemente. Arthur é recebido friamente pelos moradores da cidade, que parecem temer a casa da falecida mulher, isolada do mundo por um brejo que fica constantemente à mercê das marés. Ignorando as superstições locais, Arthur decide visitar a casa e cumprir sua tarefa, apenas para começar a presenciar fenômenos sobrenaturais que parecem estar ligados ao fantasma de uma mulher vestida em preto. Mais do que isso, Arthur descobre que, aparentemente, sempre que o fantasma da mulher de preto foi visto por alguém, uma criança da cidade morreu. O jovem advogado começa a levar os rumores a sério e tenta desesperadamente escapar da maldição que a assombração carrega consigo, antes que ela afete sua própria vida.

Para um filme de terror ser efetivo, ele precisa seguir alguns parâmetros técnicos indispensáveis, mas eu diria que os principais são a presença de um diretor que saiba criar um clima realmente assustador e uma fotografia eficiente em reforçar a paranoia do enredo. A Mulher de Preto tem os dois. Watkins tem um dom visível para o terror, e a fotografia do longa sabe explorar as situações do roteiro e apresentar enquadramentos que contribuem para o clima gradativamente opressor. A direção de arte, em especial a da casa, que é o centro do enredo, é notável, também. O grande porém do filme se torna o roteiro, muito bom em alguns pontos, bastante previsível em muitos outros. A sequência final do filme, evitando entregar qualquer revelação, deixa aquela sensação de "eu acho que já vi isso antes". De fato, eu pude adivinhar praticamente tudo que ia acontecer na última meia-hora do filme, e isso não indica qualquer dom mediúnico meu. Ainda assim, isso não estraga o objetivo central da obra: dar sustos e criar um clima palpável de terror.

Quanto a Radcliffe, o amadurecimento é notável. Ele realmente está evoluindo de um ator de uma expressão só para um profissional muito bom em sua área. Sua atuação como homem atormentado é bastante convincente. É claro que um bom caminho ainda precisa ser percorrido, mas os 22 anos do ator inglês são um argumento irrefutável de que tempo não é problema para isso. A Mulher de Preto é um passo sólido nessa trajetória, um filme que, se não ousa, consegue fazer bonito dentro do tradicional e deixa uma impressão após o fim da sessão. Assustador na medida certa e bem-dirigido, vale a pena uma conferida de quem é fã do gênero e até mesmo para algumas pessoas que não se atraem tanto pelo terror.

Nota: 4,0 de 5,0.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A entrega do Oscar 2012: Meu epílogo

E o Oscar 2011 foi embora. Graças a Deus. Sinto-me mentalmente esgotado em relação ao assunto "temporada de premiações" e preciso realmente tirar minha cabeça disso pelos próximos dias. Mas antes disso, é claro, preciso fazer o post obrigatório pós-cerimônia. E que cerimônia interessante. Nos aspectos gerais, a mais interessante dos últimos anos (o que contrasta com minha opinião em relação aos indicados como um todo, mas enfim). Aliás, verdade seja dita: a Academia premiou ontem, em maior ou menor quantidade, os seus melhores indicados de fato. Senti que ficou faltando apenas um pouco mais de atenção para A Árvore da Vida e Harry Potter e as Relíquias da Morte, mas no geral eu não tenho grandes objeções aos resultados da noite - bastante previsíveis, é verdade, mas justos. Eu pessoalmente teria dado Fotografia para A Árvore da Vida e Maquiagem para Harry Potter, mas que diferença isso faz, de qualquer forma? A distribuição foi justa: O Artista e A Invenção de Hugo Cabret são espetáculos visuais e aurais, algo que se reverteu em prêmios. Os dois filmes mais centrados em seus roteiros, Os Descendentes e Meia-Noite em Paris foram reconhecidos nas categorias de Adaptado e Original, respectivamente, o que mostrou bastante coerência na votação, também. Mas o que se pode dizer da cerimônia como um todo?

Eu já cansei de bater nessa tecla, mas preciso exemplificar isso aqui novamente: o tema de 2011 no cinema, uma tendência que se estendeu para o Oscar, foi a nostalgia. Os dois indicados que tinham como tema os primórdios do cinema somaram 10 Oscars. Mas não só nesse sentido: a Academia também foi extremamente nostálgica com relação a si mesma. Enfim, Woody Allen ganhou seu quarto Oscar. O último tinha sido década de 1980. Enfim, Meryl Streep ganhou seu terceiro Oscar. O último, adivinhem, tinha sido na década de 1980. Alguém pode dizer que a Academia errou em fazer isso? Ainda que as torcidas tenham sido outras, quantas pessoas realmente ficaram infelizes em ver nomes tão lendários do cinema sendo reconhecidos mais uma vez? São forças grandes demais, importantes demais para causar rejeição. E, é claro, uma última notinha em relação à nostalgia: Billy Crystal no comando, depois de quase dez anos afastado.

Foi uma noite de recordes, também. Eles sempre estão acontecendo, mas na noite de ontem eles apareceram em abundância. Foi a noite de Christopher Plummer, a pessoa mais velha a ganhar um Oscar competitivo em qualquer categoria, aos 82 anos. Foi a noite do primeiro Oscar para um filme iraniano, A Separação (o que me fez dar um grito de alegria, literalmente). Foi a noite que marcou a primeira ocorrência de dois Oscars consecutivos na história para alguém na categoria de Montagem, para duas pessoas, aliás: Angus Wall e Kirk Baxter, ano passado por A Rede Social, esse ano por Os Homens que Não Amavam as Mulheres (o segundo Oscar da noite que me fez dar um grito, aliás). Foi a noite em que pela primeira vez um ator francês levou o Oscar de melhor ator, Jean Dujardin. Foi a noite, enfim, em que 83 anos depois um filme mudo voltou a ganhar o Oscar de melhor filme.

Mas 2011 enfim está encerrado. Se o ano só começa depois do carnaval, o calendário do cinema dá seu pontapé inicial após o Oscar. Está na hora de receber 2012 e pensar nele. E amigo, que ano esse promete ser. O Cavaleiro das Trevas Ressurge. O Hobbit. Prometheus. Lincon. Os Vingadores. Valente. Jogos Vorazes. O Grande Gatsby. On the Road, dirigido por Walter Salles. Filmes de Steven Soderbergh, Quentin Tarantino, Paul Thomas Anderson, Tim Burton, Terrence Malick, Ang Lee e outros grandes diretores. É tanta coisa que vocês podem esperar por um post sobre o assunto logo, logo. 2012 é mais do que bem-vindo.

Caso você tenha voltado de alguma missão no espaço nas últimas horas e não faça ideia de quem ganhou o Oscar, você pode conferir minhas habilidades em copiar e colar logo abaixo:


FILME
"O Artista"

DIRETOR
Michel Hazanavicius - "O Artista"
 
ATOR
Jean Dujardin - "O Artista"

ATOR COADJUVANTE
Christopher Plummer - "Toda Forma de Amor"

ATRIZ
Meryl Streep - "A Dama de Ferro"

ATRIZ COADJUVANTE
Octavia Spencer - "Histórias Cruzadas"

ROTEIRO ORIGINAL
"Meia-noite em Paris"

ROTEIRO ADAPTADO
"Os Descendentes"
 
MELHOR FILME EM LÍNGUA ESTRANGEIRA
"A Separação" - Irã

ANIMAÇÃO
"Rango"
     
TRILHA SONORA ORIGINAL
"O Artista" - Ludovic Bource

CANÇÃO ORIGINAL
"Man or Muppet", de "Os Muppets", música e letra de Bret
McKenzie

MAQUIAGEM
"A Dama de Ferro"

DIREÇÃO DE ARTE
"A Invenção de Hugo Cabret"

FOTOGRAFIA
"A Invenção de Hugo Cabret"

FIGURINO
"O Artista"

DOCUMENTÁRIO (LONGA-METRAGEM)
"Undefeated"

DOCUMENTÁRIO (CURTA-METRAGEM)
"Saving Face"

EDIÇÃO
"Os Homens que Não Amavam as Mulheres"

CURTA-METRAGEM DE ANIMAÇÃO
"The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore"

CURTA-METRAGEM
"The Shore"

EDIÇÃO DE SOM
"A Invenção de Hugo Cabret"

MIXAGEM DE SOM
"A Invenção de Hugo Cabret"

EFEITOS VISUAIS
"A Invenção de Hugo Cabret"

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Análise: Tão Forte e Tão Perto

Dentre as várias surpresas do Oscar desse ano, a inclusão de Tão Forte e Tão Perto na categoria de melhor filme talvez tenha sido a mais chocante de todas. O filme nunca foi sucesso de público ou crítica e era considerado passado para a maioria dos fãs de cinema americanos. Mas o filme chega às salas brasileiras com um novo gás com suas duas indicações - a outra para Max Von Sydow, também surpresa, como ator coadjuvante. Eu preciso confessar que já tinha um certo preconceito inicial por causa do título brasileiro do filme, adaptado do livro do autor americano Jonathan Safran Foer, Extremely Loud and Incredibly Close. Falando com sinceridade, "Extremamente Alto e Incrivelmente Perto", que aliás é o título do livro no Brasil, seria tão complicado assim? A simplificação era mesmo essencial? Para mim, não. Inclusive, acho o original muito melhor e mais adequado. Mas no fim das contas isso é apenas uma implicância e, verdade seja dita, o menor dos problemas do filme.

Oskar Schell (Thomas Horn) é um garoto prodígio, com uma inteligência acima da média para alguém da sua idade. Seu pai (Tom Hanks), ciente disso, sempre buscou estimular as habilidades do filho propondo enigmas e quebra-cabeças ao rapaz. Oskar, porém, possui algumas dificuldades de relacionamento com outras pessoas e várias fobias sociais, como andar em transporte público, algo que se intensifica após a morte de seu pai nos atentados de 11 de Setembro ao World Trade Center. Devastado pela perda, Oskar desenvolve um fascínio pela morte e parece estar condenado a uma vida traumatizada, até encontrar uma chave entre os pertences de seu pai. Disposto a alimentar a chama da memória dele dentro de si, Oskar decide encontrar a fechadura a qual a chave pertence, guiando-se pelo sobrenome escrito no envelope que guardava a chave, Black. Em sua busca, ele receberá a ajuda de um misterioso idoso (Max Von Sydow) que mora como inquilino na casa de sua avó e que, por motivos desconhecidos, decidiu parar de falar. Essa ambiciosa jornada, porém, começa a cobrar seu preço ao deteriorar ainda mais a já conturbada relação de Oskar com sua mãe, Linda (Sandra Bullock).

Dirigido pelo Rei Midas do cinema atual, Stephen Daldry, Tão Forte e Tão Perto definitivamente tem seus méritos. O principal deles é a atuação de Thomas Horn, uma das melhores performances infantis dos últimos anos. Horn segura a barra de um personagem difícil, traumatizado e complexo, e apesar de Oskar ser irritante em muitos momentos - como muitas crianças prodígio, aliás -, ele consegue passar uma simpatia por sua determinação e em razão de todas as suas perdas que é palpável. O resto do elenco está bastante afinado também, assim  como os aspectos técnicos do filme. O que é ótimo, porque impede que o filme caia num desastre criado pelo roteiro e pelas decisões de direção de Daldry. Para começar, o roteiro é completamente instável. Ele tem bons momentos, como a relação de Oskar com o inquilino misterioso, mas se perde e muito nos momentos que exigem uma carga maior de drama. Para ser bem exato, ele se força muito para ser triste, o que é desnecessário levando-se em consideração o argumento do filme. Um pouco menos de exagero, um pouco mais de realismo ajudariam. As decisões de Daldry também me incomodaram. Toda a sequência final do filme, bastante previsível, me soou piegas e banal. É, sem dúvida, o trabalho mais fraco do diretor até o momento.

É verdade que o filme como um todo encontra certa aprovação. Dentre os nove indicados a melhor filme esse ano, ele foi o único onde ouvi sons de choro no cinema. É inegável que ele tem seus bons momentos. Mas toda sua montagem me pareceu artificial, muito voltada, justamente, para ganhar Oscars. Algumas escolhas melhores, uma mão mais acertada no drama, mais centrada e equilibrada, poderiam ter feito um excelente filme pós-11 de setembro. Mas as derrapadas na previsibilidade acabam atrapalhando. Daldry já fez melhor (cof, As Horas, cof), mas Tão Forte e Tão Perto, de tão calculado que é, acaba tendo tropeços demais para ser lembrado mais à frente.

Nota: 3,0 de 5,0.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

As previsões finais para o Oscar

A cerimônia mais importante do cinema está agora a apenas dois dias de acontecer. Depois de meses de especulações, torcidas e algumas frustrações, o mundo está prestes a conhecer quem a Academia irá premiar com o Oscar de melhor filme de 2011 (como se a gente já não soubesse, claro). Dessa forma, já está mais do que na hora de eu sair de cima do muro e me comprometer com minhas previsões oficiais para a noite do domingo.

Antes disso, devo fazer algumas considerações. Como aficionado pela temporada de premiações que acompanha todas as discussões na comunidade cinéfila pela internet, devo dizer que não me empolguei muito com os prêmios desse ano. Não que eu ache que 2011 tenha sido um ano ruim para filmes, como já ouvi muita gente dizendo por aí, o que é algo que não concordo exatamente, mas devo admitir que fiquei com a sensação de que faltou algo. Poucos filmes, pouquíssimos mesmo, me tiraram o fôlego esse ano, e olhando para a lista de indicados a melhor filme desse ano, tenho a sensação de que o grupo como um todo não é mais forte do que o dos dois anos anteriores, onde estava estabelecido o número de dez nominados na categoria. Aliás, já deixei minha crítica aqui a essa mudança nas regras que deixou o número de indicados flutuante, com base na quantidade de votos mínima que um candidato precisa receber. Minha opinião não mudou nada desde então, de forma que ainda prefiro os bons e velhos cinco indicados (e se isso não for possível, que sejam dez então, mas não essa coisa amorfa que foi esse ano).

Mas nem tudo são críticas: esse ano teve boas surpresas. Em primeiro lugar, peço que me perdoem, mas não consigo deixar de adorar escrever que Gary Oldman é, enfim, um ator indicado ao Oscar. Justíssimo e já era tempo. Também não consigo deixar de sorrir ao lembrar que eles tiveram a coragem necessária de indicar Rooney Mara em uma das melhores atuações do ano em Os Homens que Não Amavam as Mulheres. E A Árvore da Vida. O prazer de poder dizer que o longa mais pessoal do grande Terrence Malick foi indicado como Melhor Filme, um feito para o qual eu já tinha até desistido de torcer, é inenarrável.

Mas chega de divagações. Minha lista de previsões vem logo abaixo. Nem choro, nem vela. Um único palpite para cada categoria, acompanhado por um comentário:

- Melhor filme: O Artista

Impossível pensar em outro. Apesar da previsibilidade, que mata um pouco do clima da festa, devo dizer que fico satisfeito com a vitória. Definitivamente, muito melhor que o campeão do ano passado... Mas não vamos entrar no mérito dessa questão.

- Melhor diretor: Michel Hazanavicius, O Artista

Hazanavicius tem o momento a seu favor, e é loucura apostar em outro diretor que não o do filme que deve vencer. Mas com concorrentes com nomes de peso, uma surpresa aqui é possível. Improvável, mas possível.

- Melhor ator: Jean Dujardin, O Artista

Apostei por muito tempo em Clooney aqui, mas, embora a vitória dele ainda seja possível, acho que a maré virou a favor do francês, em especial depois de sua vitória no Screen Actors Guild. E faz sentido: premiar O Artista implica em premiar Dujardin por ser, simplesmente, o filme.

- Melhor atriz: Viola Davis, Histórias Cruzadas

Não só acho que vai acontecer, mas acho que é o justo. Sinto que o terceiro Oscar de Streep vai ser adiado mais uma vez... Ela definitivamente merece, mas não esse ano. A melhor atuação feminina de 2011 foi Viola Davis.

- Melhor ator coadjuvante: Christopher Plummer, Toda Forma de Amor

Molezinha da noite. Todos querem vê-lo sair da premiação com o Oscar, todos vão votar para que isso aconteça. E é uma atuação digna de nota, de fato.

- Melhor atriz coadjuvante: Octavia Spencer, Histórias Cruzadas

Spencer ganhou quase todos os prêmios da temporada e está com o caminho aberto para o Oscar. Não consigo ver ninguém tirando a estatueta dela, nesse ponto.

- Melhor roteiro original: Meia-Noite em Paris

Apostar contra O Artista aqui pode ser loucura, mas todos querem demais ver Woody Allen ganhar seu quarto Oscar domingo, então acho que isso vai falar mais alto.

- Melhor roteiro adaptado: Os Descendentes

É uma categoria difícil, mas acho que o filme de Alexander Payne vai ganhar seu prêmio de consolação da noite aqui.

- Melhor filme estrangeiro: A Separação

O filme é o favorito de todos aqui, mas essa categoria já garantiu várias vitórias surpresas no passado. Ainda assim, tenho esperança de que o excelente filme iraniano vai prevalecer aqui.

- Melhor filme de animação: Rango

Sem Tintim aqui, praticamente não existe outro candidato plausível.

Nota 1: Nessas categorias de cima, meus palpites praticamente são os mesmos da maior parte dos críticos, cinéfilos e afins, então vocês podem esperar a maior parte dessas previsões se confirmarem domingo, com uma taxa de erro de um ou dois palpites. Mais do que isso, tenham certeza: a noite foi cheia de surpresas. Para as categorias técnicas, que vem abaixo, só vou fazer comentários ocasionalmente.

- Melhor montagem: O Artista

- Melhor fotografia: A Árvore da Vida

De fato é o favorito, tanto para ganhar quanto o meu, mas tenho a sensação de que vou me decepcionar bastante aqui domingo. Espero muito estar errado.

- Melhor direção de arte: A Invenção de Hugo Cabret

- Melhor figurino: O Artista

- Melhor trilha sonora: O Artista

- Melhor mixagem de som: A Invenção de Hugo Cabret

- Melhor edição de som: A Invenção de Hugo Cabret

Hugo Cabret seria um vencedor estranho para as categorias de som, mas por incrível que pareça, é o que tudo indica. Provavelmente vou me ferrar junto com muita gente nesse ponto, apesar disso, mas palpites são palpites.

- Melhores efeitos visuais: Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 2

Não sei se é mais uma torcida minha falando mais alto ou o bom senso, mas de qualquer forma sinto que qualquer coisa pode acontecer nessa categoria.

- Melhor maquiagem: A Dama de Ferro

Não era minha previsão, estou mudando de última hora. Vou adorar estar errado, se estou, principalmente se o prêmio for para Harry Potter.

Nota 2: Por fim, vou dar chutes quase no escuro nas últimas quatro categorias das quais não vi um indicado sequer (pois é, muita vergonha, admito). Não levem muito a sério essas últimas previsões.

- Melhor documentário: Pina

- Melhor curta de documentário: The Barber of Birmingham: Foot Soldier of the Civil Rights Movement

- Melhor curta de ficção: The Shore

- Melhor curta de animação: The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore

Análise: A Invenção de Hugo Cabret

Martin Scorsese é conhecido por todo o mundo por seus filmes de temas pesados como corrupção, criminalidade e sexualidade, muitas vezes acompanhados de uma boa dose de violência. E, também, é aclamado (com todos os méritos) como um dos maiores gênios da sétima arte ainda em atividade. Essa combinação de fatores fez com que seu filme mais recente, A Invenção de Hugo Cabret, despertasse a atenção da comunidade de cinéfilos ainda em sua produção por ser uma adaptação de um livro infantil, algo sem precedentes na carreira do diretor. O resultado, que ganhou 11 indicações ao Oscar, o maior número desse ano, é de fato o filme mais leve da carreira de Scorsese. Essa leveza, porém, não deve ser confundida com vazio. Como um bom filme infantil, Hugo Cabret agrada as crianças, seu público óbvio, mas consegue falar para audiências mais maduras que vão encontrar ali significados próprios e desenvolver impressões particulares. E o filme possui ainda uma particularidade nesse aspecto: essa audiência madura que Scorsese quer conquistar não é qualquer uma, mas sim a de apaixonados pelo cinema desde o tempo de sua própria infância e dos filmes que vieram com ela. E pode-se dizer que ele acerta no alvo.

O filme, que se passa em 1931, narra a saga do personagem título, Hugo Cabret (Asa Butterfield), o filho de um inventor (Jude Law) que morre num incêndio, mas não sem antes mostrar ao filho uma descoberta que encontrou abandonada no museu onde trabalhava: um autômato. O invento aparentemente está quebrado e precisa de uma chave em formato de coração para ser posto em funcionamento. Após a morte do pai, Hugo vai morar com o tio alcoólatra (Ray Winstone) na estação de trem de Paris, onde passa a ajudar seu novo guardião em seu ofício de cuidar dos relógios do local. Quando o tio desaparece, Hugo se vê obrigado a sobreviver sozinho, morando escondido na estação, roubando comida e fugindo do inspetor do local (Sacha Baron Cohen). É em meio a essas atividades furtivas que ele conhece o dono de uma loja de brinquedos na estação, o azedo George (Ben Kingsley), e sua simpática afilhada, Isabelle (Chloë Grace Moretz, em mais uma atuação digna de nota). Hugo e Isabelle logo se tornam amigos, mas a vida do garoto muda completamente quando ele descobre que a nova companheira possui a chave que dá vida ao autômato. Ao investigarem o porquê desse fato, Hugo e Isabelle vão se deparar com o passado amargo de George e com a história da criação de uma das maiores paixões do menino: o cinema.

A Invenção de Hugo Cabret é um grande feito técnico. Sua reconstituição de época é perfeita, com uma direção de arte afiada recriando notavelmente ambientes como a estação de trem da década de 1930 e o estúdio de cinema de um dos maiores diretores dos primórdios da sétima arte, entre outros. Ajuda muito esse fato a fotografia do consagrado Robert Richardson, que ajuda a abundância de efeitos visuais a não parecer artificial em momento algum. Apesar de isso poder parecer surpreendente, é também o filme de Scorsese com a melhor mixagem e acabamento de som, o que proporciona um espetáculo tanto visual quanto sonoro. Se o roteiro não se destaca em particular, embora seja bastante eficiente, Scorsese, os atores e sua equipe fazem um filme notável.


Mas é importante não deixar de apontar aqui a grande jogada e objetivo do filme: servir como uma homenagem cinematográfica ao própria cinema. Como já argumentei nesse post anterior, 2011 foi o ano da metalinguagem no cinema, e A Invenção de Hugo Cabret é um dos melhores exemplos disso. O filme é a maneira como um diretor extremamente consagrado encontrou para demonstrar todo seu amor e agradecimento ao cinema, de quem acabou se tornando parte da história. Mas tudo isso é feito de maneira que em nenhum momento soa pretensiosa; pelo contrário, é quase com humildade que o cinema é mostrado como uma fábrica de sonhos, o que por si só já seria o bastante para justificar uma abordagem diferente, alguns diriam. Mas Hugo Cabret é como o cinema: encanta justamente por ser capaz de emocionar com propostas simples. É o sonho de criança que nunca abandona o adulto. E ainda bem que é assim.

Nota: 5,0 de 5,0.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Análise: O Homem que Mudou o Jogo

Não é nada estatístico, pelo menos não até onde eu saiba, mas se me pedissem para apontar quais esportes rendem mais filmes, minha resposta seria o boxe e o beisebol. O boxe tem um quê mais universal, um esporte que todo mundo em todos os lugares do mundo conhece e tem noção de sua estrutura. Tente puxar de cabeça quantos filmes de boxe ficaram famosos: Rocky, Touro Indomável, Menina de Ouro, O Lutador, O Vencedor, O Campeão, e por aí vai. Correndo atrás vem os filmes de beisebol, muito populares, mas que parecem sofrer uma pequena barreira quando são levados para fora dos Estados Unidos, criada pela falta de familiaridade com o jogo da maior parte dos países do mundo. É verdade que Hollywood conseguiu de certa maneira transmitir as noções gerais do esporte para fora do país onde é idolatrado, mas ainda existe muita estranheza quanto ao esporte no Brasil. No caso específico de O Homem que Mudou o Jogo, filme de Bennett Miller indicado a 6 Oscars, essa falta de familiaridade pode ser um empecilho no começo do filme ou até mesmo afugentar de vez potenciais espectadores das salas de cinema, devido ao abundante uso de termos e regras do esporte. É importante saber que essa impressão rapidamente se desfaz quando fica claro que o longa é muito mais do que outro filme de beisebol hollywoodiano.

Baseada em fatos reais, a trama gira em torno de Billy Beane (Brad Pitt), general manager (explicação leiga meia-boca: uma espécie de técnico, só que responsável pelas transações comercias dos atletas da equipe) do Oakland Athletics. Em 2001, o Oakland é eliminado na fase eliminatória da liga, criando um mal-estar no clube. Em especial, Beane encontra dificuldades em montar um time competitivo com o baixo orçamento que dispõe e, pra piorar, vê a saída dos três melhores atletas da equipe no fim da temporada. Nesse momento de crise, ele conhece Peter Brand (Jonah Hill), um graduado em economia de Yale que trabalha para uma equipe rival. Brand convence Beane de que ele pode montar um time de respeito com o pouco dinheiro que possui, com base nas teorias criadas pelo controverso teórico do beisebol Bill James. Beane contrata Brand e, juntos, começam a selecionar jogadores desacreditados - e, portanto, mais baratos -, mas que Brand acredita que possam vir a formar uma boa equipe com base em cálculos matemáticos. O método gera uma reação furiosa dos membros mais conservadores dos Oakland e uma recepção fria da imprensa esportiva, mas logo se revela com mais méritos do que se pensava inicialmente.

O Homem que Mudou o Jogo possui como maior trunfo algo que os grandes filmes de esporte também utilizaram para se guiar: a percepção de que, no fundo, eles precisam ser muito mais do que um filme de esporte. No caso do filme, o algo mais fica por conta de Billy Beane, que Pitt leva às telas de forma magistral. Beane não é o personagem mais difícil da carreira do ator, mas Pitt consegue encontrar o tom e a alma de manager com uma leveza notável, criando uma grande personificação. Que ano para Pitt no cinema, aliás. O outro destaque do filme é o indicado "surpresa" ao Oscar, Jonah Hill. Seu personagem, Brand, é baseado em Paul DePodesta, assistente de Beane responsável por levar a teoria dos cálculos matemáticos no beisebol a público. Sua atuação faz de seu personagem coadjuvante alguém tão carismático quanto o protagonista, o que é um feito digno de louvor.

Também merecedor de aplausos é o roteiro a quatro mãos de Steven Zaillian e Aaron Sorkin, facilmente os dois melhores roteiristas em atividade em Hollywood. Eles conseguem dar vida à uma história de difícil assimilação até mesmo para a maior parte dos fãs do esporte. Outro ponto excelente é o desfecho, completamente inesperado e que reserva algumas reviravoltas para quem não conhece a história real por trás do filme (e se é esse o seu caso, recomendo não pesquisar nada antes de ir ao cinema). É uma pena que minha falta de contato com o esporte tenha tornado a experiência do filme menos impactante, embora não tenha a atrapalhado em nada nem tornado a obra menos interessante para mim. Talvez o filme tenha ecoado melhor nos Estados Unidos, mas ele tem o suficiente para agradar o público brasileiro como um longa de esporte acima de média.

Nota: 4,5 de 5,0.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Análise: A Dama de Ferro

Biografias no cinema são, na minha opinião, coisas arriscadas. O gênero chamado biopic já rendeu alguns bons frutos, mas também já criou algumas aberrações. A biopic do momento é A Dama de Ferro, pretensiosa adaptação cinematográfica da vida da ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, tendo como carro-chefe a presença de Meryl Streep no papel principal. Streep, aliás, tem roubado toda a atenção do filme para si, especialmente por estar no papel que, muitos acreditam, lhe dará seu terceiro Oscar - algo que não acredito, mas falarei disso mais à frente. O fato é que isso não é de todo modo um problema, já que ter Streep no seu elenco é o único trunfo de A Dama de Ferro. Uma biopic deve antes de tudo trazer algum charme ao retratado, justificar a própria existência atribuindo algo ao seu protagonista. É verdade, nenhum envolvido em As Últimas Horas de Hitler tinha a pretensão de fazer o público simpatizar com o maior vilão da história da humanidade, mas esse filme pretendia ilustrar o estadista da maneira mais isenta possível: um homem responsável por decisões brutais, mas com motivações e escolhas baseadas em uma série de fatores que concernem ao seres humanos. É aí que A Dama de Ferro falha. Ele nunca é balanceado. É ótimo que a diretora Phyllida Lloyd tenha um posicionamento claro a respeito da figura de Thatcher, mas ela faz tanta questão que transbordemos de amor pela figura da primeira-ministra que me flagrei tentando com todas as forças fazer o contrário ao longo do filme. E bem, isso não é difícil.

Meryl Streep aparece já no começo como uma Thatcher envelhecida (com uma maquiagem muito boa, aliás), sofrendo pela perda do marido de anos, Denis (Jim Broadbent), e razoavelmente gagá. É a partir de suas memórias e de suas alucinações com o marido falecido que a trama do filme em si, ou seja, a vida de Thatcher, nos é mostrada. É então que todos os fatos marcantes de sua trajetória - seu começo como uma das poucas mulheres no mundo da política, sua entrada na Câmara, sua eleição como primeira-ministra, a crise econômica, a Guerra das Malvinas e uma série de medidas pouco populares - são mostradas num piscar de olhos (mesmo). Tudo é tão corrido que fica uma sensação de que muito pouco foi falado, no fim das contas, o que é ainda mais estranho ao se considerar que o filme sequer é grande e poderia ter sido prolongado para acomodar todos os acontecimentos melhor. Embora, é claro, eu tenha na verdade ficado feliz por não ser o caso.

O grande problema em A Dama de Ferro é a maneira como o roteiro decide abordar Thatcher, do começo ao fim. Thacher é ame ou odeie, e todo o seu governo não foi diferente. No fim, sua impopularidade atingiu níveis tão grandes, até mesmo entre seus colegas de partido, que ela precisou renunciar o cargo. Uma biografia isenta estaria preocupada em mostrar de maneira equilibrada todos os altos e baixos e demonstrar as relações de causa e consequência na vida da protagonista. Mas A Dama de Ferro não é uma biografia isenta. A sua dama de ferro também é super-humana, seus erros são balanceados por sua vontade de modificar o mundo e suas atitudes mais brutais são justificadas por um bem maior. Tudo bem que seja isso mesmo o que Thatcher pensava, mas o filme se perde ao querer ser Thatcher. Tentando com muita força imprimir toques de humanidade, o longa simplesmente acaba causando o oposto. Algo que contribui para isso, talvez, seja sua montagem atrapalhada e apressada, que acaba se tornando irritante conforme o filme progride. Um pouco mais de cuidado nesse aspecto talvez tivesse contribuído para maquiar os defeitos do roteiro, mas até aí existem muitos problemas.

O único ponto de redenção do filme acaba sendo, de fato, Meryl Streep. Lamento decepcionar em dizer que não é a atuação da carreira da atriz, nem de perto, mas todo seu calibre e experiência fazem Streep levar o filme nas costas. Infelizmente isso não é o bastante. De certa forma, é com alívio que acredito que o tão falado terceiro Oscar de Streep não virá com esse filme. Posso estar completamente enganado, afinal uma grande campanha de estúdio está sendo feita para isso, o que sempre conta, mas algo me diz que o momento ainda não é esse. Em muitos sentidos, por A Dama de Ferro no mesmo patamar de Kramer vs. Kramer e A Escolha de Sofia, as outras vitórias da atriz, é bastante problemático. Não só esses filmes são melhores, como também Streep está mais completa neles. O tempo mostrará o desenrolar dessa questão, mas a verdade é que melhor seria se A Dama de Ferro simplesmente fosse deixado para trás com o tempo, e não considerado o momento máximo da melhor atriz de Hollywood em atividade.

Nota: 2,0 de 5,0.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Análise: O Artista

Quando O Artista estreou em Cannes, ainda no meio do ano passado, o filme rapidamente se tornou um dos mais comentados entre os fãs de cinema. Nenhum choque por ele ser em preto e branco - alguns filmes recentes usam essa técnica sem causar grande agitação em torno de si. O grande fator atrativo do filme do francês Michel Hazanavicius, um virtual desconhecido para o público ao redor do mundo, era o fato do filme ser mudo. Muita gente nunca viu um filme mudo na vida. Eu, um apaixonado por cinema, vi pouquíssimos. Não sei sequer dizer há quanto tempo um filme mudo não se tornava um sucesso de crítica, mas tenho certeza que a resposta é "muitos". Logo o filme começou a despontar aqui e ali nas premiações e mesmo antes do anúncio oficial das indicações do Oscar, ele já era o favorito absoluto a melhor filme. Ainda hoje, é difícil imaginar alguém tirando o prêmio de O Artista. Tão estranho quanto possa ser para o grande público mal-acostumado, o filme conquistou a crítica e se tornou o queridinho da temporada. É compreensível. Uma verdadeira homenagem ao cinema, O Artista consegue se sustentar e apresentar um resultado marcante, embora tenha minhas dúvidas sobre sua capacidade de se tornar "histórico".

George Valentin (Jean Dujardin) é um grande astro do cinema mudo do final da década de 1920. Ele estrela em filmes de ação e aventura, tem uma legião de fãs e é o queridinho dos produtores de Hollywood. Valentin também é uma pessoa extremamente orgulhosa e até mesmo leviana, levando um casamento bastante frio com Doris (Penelope Ann Miller). Um dia, Valentin acaba conhecendo uma fã, Peppy Miller (Bérénice Bejo), que se torna famosa ao ser fotografada na companhia do ator após um incidente cômico. Impulsionada pela recente fama, e com uma grande ajuda de Valentin, Peppy começa uma carreira de figurante em Hollywood, o que só faz aumentar sua admiração por seu ídolo, que gradualmente vai evoluindo para algo mais.

Porém, o fim da década de 1920 é também a ascensão do cinema falado. Enquanto Valentin se recusa a acreditar na força da nova forma de fazer filmes, atendo-se resolutamente aos tradicionais longas mudos e perdendo o apoio dos produtores, Peppy desponta como uma estrela. Ao mesmo tempo que Hollywood abraça uma nova estrela, outra começa a se apagar, e nessa confusão de destinos os caminhos de Peppy e Valentin se cruzarão em vários momentos, de uma maneira que vai ser determinante para as decisões e escolhas de ambos.

O Artista é um daqueles filmes em que é muito difícil apontar algo de errado. Hazanavicius consegue fazer seu filme fluir na tela. Um bom filme mudo deve conseguir mostrar pelas imagens o que não consegue por palavras, sem precisar apelar para as famosas fichas de texto com frequência. O filme francês faz jus à tradição do cinema mudo e cumpre todos esses requisitos. Algumas cenas e momentos do roteiro são pura arte, como poucas vezes se vê. A cena do sonho, por exemplo, é digna de nota, assim como sua sequência final, já famosa. O que, porém, faz de O Artista um filme acima da média é Jean Dujardin como personagem título. Ele é o filme e agora consigo compreender como é difícil desassociar as duas coisas, razão pela qual percebo como o francês pode ser um candidato tão forte ao Oscar desse ano.

Que o filme é um dos destaques da temporada, é inegável e bastante justo. Sua ousadia compensa no resultado final e o filme é uma experiência bastante agradável. Contudo, não sei até que ponto ele se sustentará como atemporal e único como muitos fãs clamam. Não o considero inclusive como o melhor do ano, embora seja um dos melhores, de fato. Mas o fato é que isso não deve, ou não deveria, importar. Independente de quantos Oscars o filme vai ganhar dia 26 - e vão ser alguns - o filme deve falar por si mesmo e o público deve decidir com que carinho se lembrará dele após o fim da sessão. E nesse sentido, não tenha medo de sentir algum estranhamento e se desarme de qualquer preconceito. Com o perdão do trocadilho, O Artista é arte de verdade.

Nota: 4,5 de 5,0.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Top 10: Remakes que você (provavelmente) não sabia que são remakes

Fala-se muito em uma crise criativa nos tempos modernos. Seja no cinema, na música, no teatro, na literatura, nos videogames ou em qualquer forma de arte que você imaginar, sempre há alguém para apontar um falta de originalidade que culmina em apostas em continuações, no tradicional, nas fórmulas que sempre dão certo. Não vou refutar essas pessoas. Há, de fato, uma queda no nível de originalidade recentemente, mas isso não significa que nada de original tenha sido feito nos últimos tempos, também. Polêmicas a parte, não é de hoje que Hollywood aposta em alguns remakes em sua salada de filmes. Fazer remakes é um hábito bastante antigo, até, como a lista dessa semana mostra. É verdade que muitas vezes os remakes acabam sendo filmes dispensáveis que apenas maculam a lembrança do original. Mas muita calma na hora de fazer julgamentos precipitados: todos os filmes que estão nessa lista são muito bons, alguns já clássicos do cinema e um inclusive é um ganhador muito recente do Oscar de Melhor Filme. Estão preparados? Então confiram a lista de alguns remakes que talvez vocês não so
ubessem que são remakes:

10 - Por um Punhado de Dólares (1964)
Diretor: Sergio Leone
Remake de: Yojimbo (1961)
Diretor: Akira Kurosawa

O filme inicial da trilogia dos dólares de Sergio Leone, o rei do chamado faroeste macaroni, é também um remake do cultuado diretor japonês Akira Kurosawa, embora seguindo uma abordagem diferente e se aproveitando mais dos elementos "espirituais" do original. De qualquer forma, o filme é uma prova da influência de Kurosawa no cinema ao redor do mundo, algo que, como vocês vão reparar, é apenas comprovado mais a frente nessa lista.

9 - O Enigma do Outro Mundo (1982)
Diretor: John Carpenter
Remake de: O Monstro do Ártico (1951)
Diretor: Christian Nyby

O clássico do terror de John Carpenter é um remake de outro clássico dos anos 1950, ambos adaptando o livro de John W. Campbell, escrito em 1938. A adaptação de Carpenter, contudo, é mais fiel ao material original, e também se valeu de efeitos especiais mais afiados, uma consequência natural dos trinta anos que separam o original da nova versão. De todas as formas, um exemplo de que às vezes o remake pode sim superar o original.

8 - A Mosca (1986)
Diretor: David Cronenberg
Remake de: A Mosca da Cabeça Branca (1958)
Diretor: Kurt Neumann

Como muita gente sabe bem, remakes de filmes de terror são comuns, como o último exemplo da lista e agora esse comprovam. Aqui, outra mistura de horror com ficção científica. Tanto no filme original quanto no remake a premissa inicial é a de um cientista que sofre uma metamorfose com uma mosca após uma experiência mal-sucedida. Inegavelmente, os efeitos de maquiagem do filme de 1986 são repulsivos, ou seja, cumprem exatamente sua missão.

7 - Scarface (1983)
Diretor: Brian de Palma
Remake de: Scarface - A Vergonha de uma Nação (1932)
Diretores: Howard Hawkes e Richard Rosson

Sim, é exatamente isso. Um dos mais clássicos filmes de gângster de Hollywood é um remake. O original, de 1932, foi um grande sucesso de seu tempo, mas talvez por estar tão longe no passado tenha perdido consideravelmente sua fama. Uma pena, mas pelo menos existe a versão brilhante e sangrenta de Brian de Palma para fazer o mundo lembrar da lenda de Tony Montana, um bandido ficcional, mas tão famoso quanto Al Capone.

6 - Cassino Royale (2006)
Diretor: Martin Campbell
Remake de: Cassino Royale (1967)
Diretores: Vários, entre eles a lenda John Huston

Há quem conteste a classificação do filme de 2006 como um remake. Afinal, o filme de 1967 é uma sátira e não consta no cânone oficial dos filmes de 007. Ainda assim, são duas adaptações do primeiríssimo livro de Ian Fleming com o espião mais famoso do mundo, de modo que é digno de nota ressaltar que existem duas versões. De qualquer forma, o livro demorou para ganhar sua versão "séria", que foi também o primeiro filme de Daniel Craig como James Bond.

5 - Invasores de Corpos (1978)
Diretor: Philip Kaufman
Remake de: Vampiros de Almas (1958)
Diretor: Don Siegel

Tanto o remake quanto o original, inspirados no livro de Jack Finney, são clássicos da ficção científica. A versão de 1978 é a mais sinistra, sendo até mesmo mais dark do que o livro, mas ambas são lembradas até hoje como obras-primas do gênero entre seus fãs.

4 - Onze Homens e um Segredo (2001)
Diretor: Steven Soderbergh
Remake de: Onze Homens e um Segredo (1960)
Diretor: Lewis Milestone

O primeiro foi um grande sucesso da década de 1960, mas o segundo foi tão bem nas bilheterias e junto aos críticos que ganhou duas continuações. Em ambos, nomes de peso no elenco: na versão de 1960, Frank Sinatra liderava o grupo de simpáticos ladrões; na de 2001, George Clooney comandava Brad Pitt, Matt Damon, Bernie Mac, entre outros.

3 - O Homem que Sabia Demais (1956)
Diretor: Alfred Hitchcock
Remake de: O Homem que Sabia Demais (1934)
Diretor: Alfred Hitchcock

Acho que até quem não gosta de remakes vai considerar justo o direito de um diretor resolver reformular seu próprio trabalho em outro filme. Hitchcock readaptou seu próprio filme de 1934 para uma versão "menos amadora", em suas próprias palavras. Embora eu não seja um grande fã do filme - o mais fraco do diretor dentre aqueles que vi, na minha opinião -, a versão de 1956 se tornou uma das obras mais famosas do cineasta inglês.

2 - Sete Homens e um Destino (1960)
Diretor: John Sturges
Remake de: Os Sete Samurais (1954)
Diretor: Akira Kurosawa

O que eu disse a respeito de Kurosawa lá em cima, mesmo? Os Sete Samurais é considerado um dos filmes mais importantes de todos os tempos, e seu remake, novamente em versão faroeste, é um ícone do gênero. A transposição do Japão medieval para o Oeste americano é uma das adaptações da versão de Sturges, que segue a mesma premissa, contudo, do original, trocando as espadas dos samurais pelas armas dos pistoleiros.

1 - Os Infiltrados (2006)
Diretor: Martin Scorsese
Remake de: Infiltrados (2002)
Diretores: Andrew Lau e Alan Mak

Se lembram do vencedor do Oscar que mencionei? Os Infiltrados é o único remake a levar o prêmio de melhor filme da Academia. Uma nova versão de um filme policial de Hong Kong - na verdade, uma trilogia -, o longa acabou se tornando a consagração de Scorsese no Oscar. Nunca vi o original, mas uma coisa é inegável: a versão de Scorsese é mesmo uma obra-prima.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Análise: Histórias Cruzadas

Ah, Histórias Cruzadas. Um filme tão impactante e ainda assim com falhas tão visíveis. Há muito tempo eu não ficava com sentimentos tão conflitantes a respeito de um filme. Por um lado, é muito difícil não gostar de Histórias Cruzadas, e eu não fui exceção. Por outro, o roteiro é tão cheio de tropeços que é impossível deixar esse fato passar batido. E no geral, eu fui capaz de aproveitar a experiência do filme a despeito de tudo isso. O longa é uma adaptação do livro de Kathryn Stockett A Resposta - e devo dizer que prefiro muito mais o título original a esse genérico adotado para o cinema - e dirigido pelo estreante Tate Taylor, amigo de Stockett que comprou os direitos de adaptar o livro antes mesmo dele ser publicado. É importante ressaltar que apesar de seu conteúdo o filme sofreu algumas acusações, mesmo entre membros da comunidade negra, de racismo. Não acho que seja o caso. O filme é realmente bem intencionado, mas se perde um pouco na visão branca de sua direção. O ponto é que Histórias Cruzadas é antes de tudo um filme para brancos, para que os brancos - eu, incluído - possam se sentir bem ao perceber que as marcas racistas do passado já foram superadas por eles e como somos mais racionais e justos que nossos antepassados. Algo que, convenhamos, não é sempre verdade.

Situado na cidade de Jackson, no Mississippi, no começo dos anos 1960, Histórias Cruzadas narra a história de Eugenia "Skeeter" Phelan (Emma Stone), uma jornalista em começo de carreira e aspirante a escritora. Skeeter foi criada, como muitas pessoas de sua geração, por uma doméstica negra. A afeição por sua babá a fez se distanciar em muitos sentidos do seu grupo de amigas liderado por Hilly Holbrook (Bryce Dallas Howard), onde o preconceito racial é oculto sob várias camadas de suposta filantropia e fé cristã. Hilly é patroa de Minny (Octavia Spencer), uma doméstica que toma conta de sua mãe cada vez mais senil (Sissy Spacek, numa participação hilária). Minny possui uma grande amiga, Aibileen (Viola Davis), que trabalha na casa de uma amiga de Skeeter e Hilly cuidando de sua filha. Skeeter vai gradualmente se inconformando com a discriminação com a qual as empregadas negras são tratadas por suas patroas e decide escrever um livro sobre o tema. Para isso, busca a ajuda de Aibileen, que, mesmo relutante a princípio, aceita narrar sua história a Skeeter. Enquanto isso, Minny, demitida por Hilly após um incidente, passa a trabalhar para Celia Foote (Jessica Chastain), um nova-rica de modos afetados, mas isolada pelas outras mulheres da cidade. Empregada e patroa começam a desenvolver uma amizade, contrariando todas as possibilidades, o que dá forças para Minny se juntar a Skeeter e Aibileen no projeto e narrar sua experiência traumática com Hilly.

Sendo bem direto, meu principal problema com Histórias Cruzadas foi seu roteiro. Sim, ele é extremamente focado em despertar emoções - não vou negar que em mais de um momento do filme fiquei com lágrimas nos olhos, o que é extremamente raro. Porém ele inegavelmente força isso um pouco demais, além de nunca sair do raso e se apoiar demais em dicotomias. O roteiro não é completamente falho, contudo: ele sabe dar um ritmo para o filme que não o torna pesado demais, mas também não o faz se perder em momentos de alívio cômico, ainda que eles sejam abundantes. Fiquei apenas com a sensação de que ele podia ser mais bem trabalhado, mais refinado, não tendo medo de mergulhar em águas mais profundas.

O que torna o filme extremamente interessante, porém, são suas atuações. Viola Davis brilha como nunca com sua reservada e machucada pela vida Aibileen. Ela toma o filme para si, quando poderia acabar caindo em uma aura de coadjuvante, e se torna a protagonista de fato da história, mais do que Skeeter, sendo a voz negra que amarra a trama e a narradora de fato dos eventos. Não só é possível entender porque ela pode derrubar o tão falado terceiro Oscar de Meryl Streep esse ano, como estou torcendo por isso. Octavia Spencer faz uma Minny engraçadíssima, que é quase que um oposto completo de Aibileen: extrovertida, audaciosa e consideravelmente "insolente", entre aspas mesmo, já que o adjetivo é uma questão de referencial. Spencer faz uma dobradinha genial com Jessica Chastain e sua divertida, porém problemática, Celia Foote. Chastain está, para variar, perfeita, apesar do papel consideravelmente rápido para sua complexidade. Mas é Bryce Dallas Howard, assombrosamente ignorada pelas premiações, quem faz uma coadjuvante perfeita. Sua antagonista, Hilly, pode até ser exagerada por conta do roteiro, mas a atuação de Howard é sob medida e ela consegue se impôr sobre qualquer problema e roubar algumas cenas. O "confronto final" entre sua personagem e Aibileen é uma das melhores sequências em termos de atuação dos tempos recentes.

De toda forma, Histórias Cruzadas consegue cumprir sua proposta, ainda que de maneiras levemente tortuosas. Novamente, o grande problema do filme é dar uma visão muito branca num drama sobre a história atribulada dos negros num país com um histórico de fortes problemas de racismo, os Estados Unidos. De qualquer forma, é um grande avanço se comparado a outros filmes mais clássicos do cinema que abordaram o preconceito no sul americano sob a ótica do "herói branco", como Mississippi em Chamas e No Calor da Noite (certo, esse último tinha o Sidney Poitier como um dos protagonistas, mas em uma situação de roteiro completamente diferente que não cabe discutir aqui). O importante é atentar para a mensagem que o filme quer passar, e que não se limita a lançar uma luz sobre o passado de abusos dos negros americanos. O recado é mais universal e direto: até que ponto as coisas realmente evoluíram? As empregadas ainda não estão, afinal, isoladas entre seus quartinhos e as cozinhas das casas onde trabalham e precisam madrugar para chegar em pleno 2012? E não é irônico que, em 84 anos de Oscar, Viola Davis esteja lutando para se tornar a segunda mulher negra a vencer o prêmio de melhor atriz? Certas mudanças, afinal, levam muito tempo para acontecer. E é isso que Histórias Cruzadas, pense o que for, tem a nos dizer.

Nota: 4,0 de 5,0.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O que esperar da noite do Oscar

Fevereiro chegou e com ele a reta final da temporada de premiações. Basicamente falta quase nada de relevante acontecer até a noite do Oscar. Esse domingo, o Bafta anuncia seus vencedores, e embora eles antecipem muitas vezes algumas surpresas que ocorrerão na entrega dos prêmios de seu irmão americano, no geral a premiação inglesa segue seu próprio caminho. Talvez mais revelador seja o Writers Guild Award dia 19, consagrando alguns dos melhores roteiros de 2011 e servindo como ótimo termômetro para o Oscar. Mas a verdade é que até o dia 26 pouca coisa de novo ocorrerá, de modo que já podemos fazer algumas previsões com mais clareza. Obviamente, a arte de se fazer previsões é incrivelmente falha e, em se tratando do Oscar, tudo pode acontecer, mas vou tentar ao longo desse post apresentar o que é mais provável acontecer no dia da cerimônia. E vale avisar que isso não são minhas previsões oficiais - elas só saem mesmo na véspera, dia 25.

- Melhor filme: Não vejo derrubando O Artista. Honestamente, ninguém mesmo. O filme levou o Globo de Ouro de Comédia, Producers Guild Award, o Directors Guild Award e deve levar o Bafta domingo. Os únicos que ainda possuem uma chance são A Invenção de Hugo Cabret (o filme mais indicado, embora isso não signifique necessariamente muita coisa) e Os Descendentes (vencedor do Globo de Ouro de Drama, o que na última década foi mais uma maldição do que uma benção), mas até mesmo uma vitória de um dos dois seria um choque.

- Melhor diretor: Michel Hazanavicius é a aposta lógica, mas eu ainda consigo ver Scorsese roubando a cena no final. A favor de Scorsese contam seus status de lenda do cinema e seu oponente ser virtualmente desconhecido (mais uma vez, isso não atrapalhou em nada Tom Hooper ano passado...). Ainda assim, o diretor de O Artista tem tudo para ganhar, especialmente depois de levar o Directors Guild Awards.

- Melhor ator: Há algumas semanas atrás, George Clooney estava imbatível, mas Jean Dujardin ganhou uma força incrível na disputa, o que sem dúvida animou as coisas. Ainda aposto em Clooney, mas não vou ficar nada surpreso se Dujardin levar, e posso mudar minhas previsões té dia 25.

- Melhor atriz: A briga entre Meryl Streep e Viola Davis promete ser a melhor da temporada. Streep sempre bate na trave e eu tenho a sensação de que esse ano não vai ser diferente. Viola Davis está num papel que basicamente obriga os membros da Academia a dar o Oscar a ela, além de ser uma atriz maravilhosa, claro. Glenn Close, que há alguns meses era favorita, vai provavelmente apenas aproveitar o show (pela sexta vez...).

- Melhor ator coadjuvante: Christopher Plummer. E fim. Se quiserem fingir alguma emoção, a inclusão surpresa de Max Von Sydow no último segundo pode significar alguma concorrência - os dois têm a mesma idade, nunca ganharam um Oscar, tem dezenas de filmes no currículo e por aí vai. Mas Plummer é o favorito desde sempre e não vai cair agora.

- Melhor atriz coadjuvante: É loucura apostar em qualquer outra pessoa que não Octavia Spencer. Ela ganhou todos os prêmios até aqui e ainda pode se beneficiar de membros se sentindo culpados por não dar o Oscar para Viola Davis resolvendo recompensar Histórias Cruzadas por meio dela. Qualquer que seja o caso, ela deve ganhar. A úncia concorrente talvez seja Berenice Béjo, que pode se beneficiar caso O Artista faça uma lavada dia 26, o que não acho que vai ser o caso. Jessica Chastain deve ter sido premiada por seu ano mágico no cinema apenas com a indicação, mesmo.

- Melhor roteiro original: Meia-Noite em Paris deve levar. É o filme de Allen mais querido pelos críticos desde... Tiros na Broadway? Allen deve ganhar seu terceiro Oscar por roteiro aqui e quarto no geral. Só perde, como disse no caso acima, se O Artista vier arrasador e ganhar aqui também.

- Melhor roteiro adaptado: Uma disputa acirrada entre Os Descendentes e O Homem que Mudou o Jogo. O Writers Guild Awards deve desempatar. Meu voto por enquanto está com Os Descendentes porque eles amam Alexander Payne - e se Clooney perder o Oscar, eles podem compensar o filme aqui, acreditem, a Academia faz essas coisas de vez em quando, e não existe maior prêmio de consolação que Oscar de Melhor Roteiro.

- Melhor montagem: Diferente de outros anos, estou completamente no escuro nessa categoria. O filme com mais pinta de vencedor, Os Homens que Não Amavam as Mulheres, não está indicado a Melhor Filme, e essa é a categoria técnica que mais casa com o prêmio máximo. Estou inclinado a apostar em O Artista por ele ser o favorito da noite, mas tenho a sensação de que o filme de Fincher pode ganhar seu único Oscar da noite aqui.

- Melhor fotografia: Havendo justiça, Emmanuel Lubezki já estaria com seu Oscar em casa por A Árvore da Vida aqui. Logo, ele não vai ganhar. Minha aposta vai para A Invenção de Hugo Cabret, que afinal deverá ganhar alguns prêmios técnicos. Mas mantenho uma fézinha em Lubezki.

- Melhor direção de arte: Uma categoria onde quanto mais, melhor. A Invenção de Hugo Cabret deve levar, com Harry Potter na cola, mas razoavelmente distante.

- Melhor figurino: Outro quanto mais, melhor. E na dúvida ainda, vá para o filme que se passa mais no passado. Eu nunca acerto aqui, então vou chutar que Hugo e O Artista tem chances, mas quem tem mais cara de vencedor, olhando as premiações anteriores, é Jane Eyre.

- Melhor maquiagem: Adivinhem: quanto mais, melhor. Por isso acho que Harry Potter é o favorito aqui, seguido de perto por A Dama de Ferro (que é mais sutil e talvez precisasse de um Oscar para Streep para ganhar impulso).

- Melhores efeitos especiais: Embora abundância também seja importante aqui, ser indicado a melhor filme conta muito a favor. Hugo tem uma ligeira vantagem, mas o prêmio pode ser sentimental e ir para Harry Potter ou premiar realmente quem usou e abusou de efeitos, no caso, Planeta dos Macacos: A Origem.

- Melhor mixagem de som: Sinto que vai dar Cavalo de Guerra, mas também tô um pouco no escuro nessa categoria. Minha aposta então é a mais segura. Não curti nada o filme de Spielberg, mas sendo imparcial, o departamento de som fez seu trabalho muito dignamente.

- Melhor edição de som: Repito tudo que disse acima, também aposto em Cavalo de Guerra. Especialmente porque a Academia tende a premiar o mesmo filme nas duas categorias.

- Melhor trilha sonora: Essa eu diria que é certa para O Artista. Talvez Hugo crie alguma concorrência, mas eles não vão resistir em premiar a trilha que é basicamente o único som ouvido ao longo do filme que eles vão consagrar como o melhor do ano.

- Melhor filme estrangeiro: Essa categoria vive surpreendendo, mas acho que é seguro dizer que A Separação está firme em seu status de favorito.

- Melhor animação: Depois da esnobada terrível, mas previsível, em Tintim, Rango está com campo livre para marcar seu gol e levar o Oscar, ainda mais olhando seus fracos concorrentes num ano extremamente sem graça para animações.

Não vou me arriscar em documentários e curtas pois afinal essas são aquelas categorias que ferram com o bolão de todo mundo. Quanto a todas as outras, apontei o que é mais provável de vir a acontecer dia 26. Mas se surpresas acontecerem, e acredite, acontecerão, não me culpe: afinal, é disso que o Oscar é feito.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Análise: Os Homens que Não Amavam as Mulheres

Sempre ao assistir um filme que é uma adaptação de um livro que eu já li, um dos meus passatempos quase automáticos é analisar como o roteiro irá solucionar o problema de condensar as toneladas de informação da fonte original para cerca de duas horas de projeção. As naturezas diferentes de cinema e literatura pedem que algumas concessões sejam feitas no diálogo entre as duas formas de arte, o que costuma ferir os sentimentos e expectativas de fãs de uma determinada obra quando ela é transposta para às grandes telas. Em especial, eu tinha algumas preocupações de como esse problema seria solucionado com um dos livros de mistério mais densos, cheio de detalhes e recheado de idas e vindas dos últimos tempos como Os Homens que Não Amavam as Mulheres. A preocupação era à toa. O filme de David Fincher é uma das melhores adaptações recentes de um livro para o cinema - não, eu não vi o original sueco, então não farei comparações -, talvez a melhor desde O Senhor dos Anéis. Toda a natureza complexa do livro é representada fielmente, o que também produz um filme de atmosfera pesada e momentos chocantes, que trazem angústia até mesmo para quem já sabe o que vai acontecer.

Daniel Craig interpreta Mikael Blomkvist, um jornalista sueco que trabalha na revista independente Millennium e que está enfrentando a pior crise de sua vida. O tribunal sueco o condenou por difamação ao poderoso empresário corrupto Hans-Erick Wennerström, a quem Mikael denunciou sem saber que estava caindo numa cilada. Enquanto vê sua carreira ir por água abaixo, ele recebe uma proposta inesperada do milionário Henrik Vanger (Christopher Plummer), um homem já envelhecido e que mora em uma isolada ilha com alguns membros de sua família: investigar o desaparecimento de sua sobrinha Harriet, ocorrido quase quarenta anos antes e que Henrik acredita fortemente se tratar de um caso de assassinato, sob o disfarce de estar escrevendo a biografia do velho empresário. Henrik suspeita de toda a sua família, que, de fato, é formada pelo pior grupo de pessoas que se pode imaginar. Não faltam suspeitos: seu sobrinho Martin (Stellan Skarsgard), irmão de Harriet; sua sobrinha Cecilia (Geraldine James), prima de Harriet; a irmã de Cecilia, Anita (Joely Richardson); até mesmo o delegado da família, Dirch Frode (Steven Berkoff). Relutante a princípio, Mikael não vê como recusar o emprego quando Henrik oferece podres do passado de seu desafeto Wennerström como recompensa.

Porém o caminho de Mikael logo se cruza com o de Lisbeth Salander (Rooney Mara, um achado de Fincher), uma jovem hacker com problemas de socialização e que passou a vida toda sob a tutela do Estado. Lisbeth experimentou todo tipo de violência contra si, o que apenas contribuiu para seu isolamento social, mas que não impediu que ela desenvolvesse seu talento para investigações e aguçasse ainda mais sua mente analítica. Mikael e Lisbeth começam a desencavar segredos do passado da família Vanger e percebem que o que parecia ser um desaparecimento na verdade é uma das engrenagens de uma história brutal e complexa.

Verdade seja dita: por mais que a história criada por Stieg Larsson seja fascinante e o roteiro de Steven Zaillian faça jus a ela, Os Homens que Não Amavam as Mulheres é Lisbeth Salander. A personagem é uma das criações mais marcantes dos últimos tempos e, ainda que sua moral e suas atitudes possam ser questionadas, é impossível não simpatizar com ela e torcer por seu destino. Rooney Mara rouba todas as cenas em sua interpretação e ganhou uma indicação justíssima ao Oscar. A hiper-coadjuvante de A Rede Social se revelou uma das maiores apostas da nova geração. O elenco todo, aliás, está afinado, mas é Mara quem toma o filme para si. Fincher, por sua vez, talvez faça a direção mais experimental de sua carreira, o que já fica claro no começo com a abertura do filme, uma abertura mesmo, com efeitos totalmente digitais enquanto os créditos rolam. Isso já foi relativamente comum no passado, mas saiu de moda há muitos anos - a nova ordem é mostrar o menor número de créditos possíveis no começo do filme; se possível, nenhum. A abertura do filme, porém, é pontual para dar o tom do que virá depois e o resultado é de bastante classe, em especial pela trilha sonora de Led Zeppelin escolhida para o momento. Outro ponto notável são as pequenas referências e brincadeiras no decorrer do longa: um personagem usa uma camisa com o logo do Nine Inch Nails (banda de uns dos autores da trilha sonora, Trent Reznor); em outro momento, o clímax brutal do filme recebe como trilha Orinoco Flow, de Enya (!). Pequenos detalhes que conseguem quebrar a tensão do filme - e acredite, que tensão.

Se seria impossível retratar com fidelidade absoluta todos os acontecimentos do livro, o filme faz um excelente trabalho. Zaillian faz um roteiro conciso e de fácil absorção para quem não leu o livro, embora a pessoa talvez tenha um pouco de dificuldade para acompanhar alguns detalhes, que no fim não estragam em nada a trama como um todo. Nos momentos em que a história precisa correr mais, entra o trabalho brilhante dos montadores Angus Wall e Kirk Baxter, vencedores do Oscar ano passado por A Rede Social e que mereciam muito uma dobradinha. Quem também repete um trabalho perfeito é Trent Reznor e Atticus Ross, que entregam uma trilha arrepiante e que casa perfeitamente com a atmosfera do que se vê na tela. Os fãs tem todos os motivos para respeitar o trabalho feito por Fincher aqui. Quem não conhece a obra original deve ir avisado de antemão: o filme é pesado, muito pesado mesmo, com temas fortes de misoginia e violência sexual, culminando com uma cena de estupro. Se isso não for um empecilho para você, não deixe de conferir. Os Homens que Não Amavam as Mulheres é um thriller moderno de primeira classe.

Nota: 5,0 de 5,0.