terça-feira, 24 de abril de 2012

Pixar: quando filmes para crianças são mais que isso

Colocar sonhos nas telas do cinema. Pode-se dizer que esse sempre foi o lema não-oficial da Pixar e de suas animações. Com uma história de décadas, a trajetória do estúdio cruza com nomes como a Lucasarts, no seio de quem nasceu e cresceu; Steve Jobs, que comprou o grupo na década de 1990; até chegar na Disney, que se tornou a principal parceira do estúdio e a atual detentora de suas ações. Com seu estilo baseado em animação gerada por computadores, a Pixar se tornou uma das pioneiras do ramo - Toy Story é o primeiro longa totalmente no estilo, embora haja quem afirme que o brasileiro Cassiopéia foi o primeiro 100% computadorizado de fato. Discussões acaloradas à parte, a Pixar veio a se tornar o maior estúdio de animação digital do mundo, talvez superando a própria Disney em popularidade na última década. A pergunta que fica é: por quê? Como um estúdio que começou a produzir longas há 17 anos pode ter se tornado um fenômeno cultural tão grande?

Na época de seu lançamento, Toy Story era algo inacreditável, uma verdadeira sensação para a maior parte do público. Sim, a animação, produzida em parceira e distribuída pela Disney, era realmente de uma qualidade espantosa, com uma riqueza de detalhes que ainda hoje é capaz de fazer o crítico mais exigente sorrir. Sua continuação, Toy Story 2, que a Disney chegou a planejar fazer diretamente em vídeo, e Vida de Inseto, os dois projetos seguintes da Pixar, não deixaram por menos, exibindo uma produção cada vez mais apurada e bem executada. Mas outra coisa se destacava fortemente, algo que ia além do assombro visual: os roteiros. Os desenhos do grupo tinham roteiros muito bons, fugindo do esquema tradicional da princesa encantada em perigo e do tirano usurpador (que produziu grandes clássicos, claro, mas que pede por uma pausa e uma reinvenção).

A grande sacada da Pixar foi produzir longas que, de certa forma, eram atemporais. Vamos analisar um grande clássico da Disney em comparação, O Rei Leão, por exemplo (aliás, minha animação favorita - achei que vocês deveriam saber). Seu tema, argumento e desenvolvimento permitem que o longa seja apreciado por pessoas de todas as idades, sempre, mas ele deixa uma marca especial exclusivamente nas crianças. Ele é pensado para ser assim, esse é seu apelo. Agora, consideremos um filme como Up. Seu apelo inicial é o público infantil, é óbvio, mas ele tem um ponto de virada. Sua história consegue falar alto com pessoas de qualquer idade, talvez dialogando melhor até mesmo com uma plateia mais madura. Até mesmo um filme que parece ser moldado exclusivamente para crianças, como Procurando Nemo, encontra esse eco necessário em outras idades que faz com que ele seja, de fato, uma experiência que não vê barreiras etárias.

E são em filmes mais "experimentais", como WALL-E, uma das animações de estrutura mais inusitada dos últimos tempos, que a genialidade da equipe de Pixar em conduzir suas histórias fica escancarada. Uma trama de amor em essência, mas que abraça uma série de temas periféricos, como solidão e inadequação, que não são tão facilmente absorvidos por um público mais jovem, mas rapidamente assimilados com o passar do tempo. Talvez seja esse o ponto que separa de maneira direta a Pixar da Disney. Ambos apreciáveis em qualquer idade, ambos produzindo obras eternas, ambos errando às vezes, mas sempre se mantendo no topo do que fazem. Porém, talvez quando ficamos velhos nos tornamos mais Pixar do que Disney, o último tendo mais aquele gosto quase agridoce de recordações de infância. E, enquanto a Pixar se prepara para levar mais multidões ao cinema com Valente no meio desse ano, nos preparamos nós para dar voz aquela criança que temos e que gosta (melhor seria: precisa) de se expressar de vez em quando. Ela pode agradecer e muito à Pixar pela chance dada todo ano, e que sempre se renova, melhor e melhor.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Análise: Espelho, Espelho Meu

Nem mesmo o grande esforço que é feito para criar uma ambientação visual impressionante em Espelho, Espelho Meu salva o filme de ser mais uma maçã envenenada do que algo tão gracioso quanto a Branca de Neve de Lily Collins. Dirigida por Tarsem Singh, essa adaptação tenta criar uma versão do clássico conto de fadas dos Irmãos Grimm engraçada, com toques generosos de fantasia e voltada para um público mais infantil - quase o oposto da versão que estreará mais à frente estrelada por Charlize Theron e Kristen Stewart, que vende-se como dark e teen. Por mais que eu tenha tentado olhar o filme de Singh com simpatia desde as primeiras notícias a seu respeito, a verdade é que a experiência de assisti-lo passou longe de ser agradável. Não porque eu já não esteja na faixa de idade do público-alvo - isso nunca foi empecilho-, mas pelo simples fato de que o filme tem tantos problemas que chega a ser extremamente entediante.

A história apresenta pequenas variações em relação ao conto: um rei viúvo se casa com uma bela e vaidosa mulher (Julia Roberts). O soberano um dia desparece na floresta, deixando a Rainha para cuidar do reino e de sua filha do primeiro casamento, Branca de Neve (Lily Collins), dita ser a mais bela mulher do mundo. Com inveja da enteada, a Rainha a mantém trancada no castelo, até que a princesa um dia consegue fugir e conhece a pobreza que a nova governante fez cair sobre seu reino. Nessa saída ela também conhece o príncipe Alcott (Armie Hammer), um nobre em busca de aventuras. Desnecessário dizer como eles se apaixonam à primeira vista. O príncipe acaba no castelo da Rainha, que, em meio a uma crise financeira, arma um plano para se casar com ele. Para isso, ela decide dar um fim em Branca de Neve, que conquistou o coração do príncipe e começou a confrontá-la a respeito de sua administração. Ela manda seu servo Brighton (Nathan Lane), que assume o posto do caçador da história tradicional, matá-la na floresta, mas o homem se compadece e deixa a menina escapar. Branca de Neve acaba se refugiando no esconderijo dos Sete Anões, um grupo de ladrões que foram expulsos das cidades por serem "indesejáveis". Juntos, eles vão lutar para que Branca de Neve recupere tudo que perdeu e depor sua madrasta tirana.

Os aspectos visuais do filme são de fato deslumbrantes: a direção de arte e o figurino estão bastante competentes. Os efeitos especiais, se não impressionam, não deixam nada a dever, também. Lily Collins está bem como a Branca de Neve, em uma caracterização bem próxima da qual eu imagino para a personagem original. Apesar disso, torna-se quase forçado pensar nela como a mulher mais bonita do mundo quando ela contracena ao lado de Julia Roberts, que, embora não esteja em seu melhor momento, é a maior graça do filme e possui as melhores cenas.

Porém, a maior parte dos defeitos se concentra em dois pontos: a direção enrolada de Singh, que não explora bem as melhores oportunidades da trama nem tentar extrair mais de seus atores, e o roteiro capenga. Em nenhum momento a história apresenta originalidade o bastante para afastá-la do posto de mais uma adaptação genérica. As piadas soam quase forçadas na maior parte das situações e alguns personagens, como o do príncipe, são incrivelmente mal-desenvolvidos, aparecendo rasos e sem carisma. Até gostei da forma como os anões foram explorados nessa versão, mas com um roteiro tão fraco, todo o potencial deles é desperdiçado em mais piadinhas que não fazem ninguém de fato rir. Junte a isso uma fotografia que mistura momentos razoáveis com outros inusitados e uma montagem que às vezes soa alucinada demais para o estilo da obra e chegamos ao resultado final: um filme com boas intenções, mas que escorrega demais em um número muito grande de falhas, soando perdido e pouco inspirado. Não sei o que será da segunda adaptação da história, mas talvez ainda haja tempo de buscar inspiração sobre o que não fazer.

Nota: 2,0 de 5,0.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Flashback: Titanic

Depois de quase duas semanas "fora", estou de volta. A razão pela ausência de post nesse intervalo é pura e simplesmente minha completa falta de tempo. Mas uma coisa eu posso garantir: não deixei de pensar no blog em nenhum minuto, e, na verdade, estou planejando algumas mudanças na casa para breve. Falarei mais sobre isso nos próximos posts, mas prometo que não vou deixar tanto tempo se passar sem atualizações por aqui.

Para voltar com todo o gás, e atendendo a alguns pedidos, resolvi aproveitar essa onda de ressuscitar filmes em versão 3D para falar daquele que talvez é o maior clássico do cinema dos últimos 20 anos, o que sem dúvidas justifica sua resenha neste blog: Titanic, de James Cameron. Seu legado é conhecido: foi o filme mais caro a ser produzido até então, a maior bilheteria de todos os tempos (foi superado depois por Avatar, também de Cameron), o filme com mais indicações ao Oscar, 14, empatado com A Malvada, e o filme que ganhou mais Oscars, 11, empatado com Ben Hur e O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei. Em uma nota mais pessoal, foi o primeiro filme não-animação que vi no cinema, o que de várias formas é algo bem marcante. Dito tudo isso, eu preciso deixar bem claro que não, não acho que Titanic seja o melhor filme da história e o maior feito cultural já realizado pela mão humana - mas também acho que seus detratores exageram e muito em sua fúria. É sem dúvidas um filme emocionante, extremamente bem-filmado e dirigido e definitivamente marcante, embora com o tempo eu tenha observado melhor uma ou outra falha que me impedem de falar em "perfeição".

Todo ser humano que não viveu na Terra Média ou em Nárnia nos últimos quinze anos conhece a história do filme, então apenas darei as pinceladas básicas. O Titanic foi o maior e mais luxuoso navio de seu tempo e era considerado insubmergível. A trama do filme começa na atualidade, com uma expedição do caçador de tesouros Brock Lovett (Bill Paxton) explorando os destroços do navio atrás do colar de diamantes conhecido como Coração do Oceano, que afundou com a embarcação. Ao encontrar uma pintura de uma bela mulher nua, Lovett é contatado por uma centenária Rose Dawson (Gloria Stuart), que conta a equipe sua saga como sobrevivente do naufrágio do Titanic. Uma adolescente Rose (Kate Winslet) embarcou no navio com a mãe (Frances Fisher) e o noivo, o mau-caráter Cal (Billy Zane). A bordo, Rose conheceu Jack Dawson (Leonardo DiCaprio), um pobretão com um talento notável para desenho. Os dois se apaixonam, para desgosto da mãe de Rose e ira de Cal, mas o maior dos problemas deles surge quando o navio se choca contra um iceberg - e o resto, literalmente, é história.

Titanic é provavelmente o melhor exemplo do talento de James Cameron para filmes de ação e efeitos. Sua reconstituição é magistral e as cenas do naufrágio do navio são verdadeiramente épicas. Em todos os aspectos técnicos, Titanic é de fato lendário. Não há um elemento sequer destoando, e é possível ver a mão de Cameron interagindo em cada cena e cada detalhe. O diretor, de fato, sempre foi famoso por seu preciosismo e presença constante (o que lhe rendeu a fama de ditador por alguns). Outra marca registrada de Cameron que o longa representa é sua preferência por filmes grandes e que não poupam despesas. Titanic é gigantesco em todos os aspectos. Pode não ser o meu preferido de sua filmografia, mas é um dos mais lindamente finalizados, sem dúvida. O elenco é bastante competente, com o destaque ficando para Stuart. Tanto DiCaprio quanto Winslet teriam atuações mais impactantes no futuro, mas foi aqui que suas carreiras realmente decolaram.

O meu grande porém com Titanic, contudo, uma questão que conforme os anos passam só se intensifica, é justamente seu roteiro. Sendo bastante direto: ele é fraco. É quase fraco demais para toda a produção que se construiu sobre ele. James Cameron nunca foi um grande roteirista - ele é mais um homem de imagens do que de palavras - e Titanic deixa isso claro. A banalidade de seu roteiro, quase clichê, incomoda bastante. É uma grande pena, pois uma história mais afiada poderia ter verdadeiramente colocando o filme em um outro patamar. Mas, de maneira geral, isso não teve qualquer influência no resultado final. O filme ainda é um sucesso, ainda existem jogadas de marketing sobre ele e referências culturais a seu respeito estão em qualquer lugar na internet. Em seus méritos, que são muitos, é um filme arrasador, e que ainda será lembrado por um longo, longo tempo.

Nota: 4,5 de 5,0.

domingo, 8 de abril de 2012

Top 10: Músicos que viraram atores

A trajetória de um artista no mundo da música muitas vezes pode acabar dialogando com outras formas de arte. Muito frequentemente - em especial nos últimos tempos -, o cinema tem abraçado cantores e cantoras que resolveram fazer suas experimentações nas grandes telas. Ao contrário do que alguns poderiam esperar, essas experiências costumam ser bastante positivas. Muitos cantores já se revelaram atores talentosos. É claro que, da mesma forma, houve algumas situações desastrosas, também. O top 10 de hoje do blog é dedicado justamente a esses artistas que transpuseram as ondas da música atéo cinema, independente do resultado. Duas regras: primeiro - o artista precisava ser músico antes de ator, e não um ator que resolveu cantar também, para que o nome da lista faça algum sentido. Segundo - a carreira no cinema deve ser sólida. Uma participação como si mesmo em um filme de comédia não conta. Estamos falando de papéis pra valer, que exigem esforço de interpretação (ainda que isso não sempre aconteça. Bem).

10 - Jennifer Lopez
Melhor momento: Hum, sua dublagem em FormiguinhaZ

Se é para fazer essa lista, melhor começar do pior. Jennifer Lopez sintetiza em si tudo que pode dar errado quando alguém do mundo da música entra despreparadamente para o cinema, apoiado em uma carreira pop. Meu exemplo acima não foi apenas pelo humor, eu realmente não consigo apontar qualquer exemplo sério na filmografia de Lopez para usar aqui. Ainda assim, sua carreira é grande demais para ser simplesmente negada nessa lista.


9 - Ice Cube
Melhor momento: Os Donos da Rua

A carreira do rapper no cinema pode ser bastante inconstante (com ele tendo participado de alguns desastres como Anaconda junto com... Jennifer Lopez), mas teve seus bons momentos. Sob os cuidados de bons diretores, como John Singleton e Kathryn Bigelow, Cube já rendeu atuações interessantes.




8 - Eminem
Melhor momento: 8-Mile

Outro rapper a aparecer nas grandes telas, Eminem pode só ter participado de um grande sucesso, seu autobiográfico 8-Mile, pelo qual ganhou o Oscar de melhor canção por Lose Yourself, mas esse caso já é significativo o bastante para ser digno de nota. Tendo feito apenas pequenas participações depois, dificilmente Eminem voltará a fazer um papel importante.



7 - Björk
Melhor momento: Dançando no Escuro

Depois de participar de produções islandesas, a exótica Björk foi escolhida para protagonizar esse que talvez seja o filme mais acessível de Lars Von Trier. Por sua atuação, ela ganhou o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes (o que me lembra como Von Trier dirige bem suas atrizes, mas enfim, não vamos divagar).




6 - Jennifer Hudson
Melhor momento: Dreamgirls

Saída diretamente do popular reality show American Idol para o mundo, Hudson ganhou o Oscar e vários outros prêmios de melhor atriz coadjuvante por seu papel de estreia em Dreamgirls. De lá pra cá a atriz em pegando outros papeis coadjuvantes, mas se prepara para fazer sua primeira protagonista como Winnnie Mandela, a esposa do lendário líder sul-africano.




5 - Justin Timberlake
Melhor momento: A Rede Social

Membro da boy band do final dos anos 1990 N'Sync, Timberlake surpreendeu muita gente ao construir uma carreira sólida como ator. Ganhador de dois Emmys por papéis na televisão, seu maior destaque no cinema até agora foi A Rede Social, como o fundador do Napster Sean Parker. Um ator bastante promissor.



4 - Queen Latifah
Melhor momento: Chicago

Queen Latifah é um caso de uma cantora tão consagrada no cinema que muita gente simplesmente se esquece ou sequer sabe que tem uma carreira além de fazer filmes. Com uma das filmografias mais respeitáveis dessa lista, Latifah é um caso de sucesso notável.



3 - Madonna
Melhor momento: Evita

A carreira da diva do pop no cinema (que teve sua estreia na direção com Sujos e Sábios e voltou a assumir o posto esse ano com o criticado W.E.) pode ser marcada por altos e baixos, mas é inegavelmente significativa. Seu papel mais forte foi seu dúvida o de Evita Perón, que se tornou aquele que todos associam ao pensar na cantora nas grandes telas. Melhor assim do que lembrarmos de certos desastres como Destino Insólito.



2 - Cher 
Melhor momento: Feitiço da Lua

Com uma carreira musical iniciada em 1965, Cher foi uma atriz de destaque em especial nos anos 1980, quando ganhou um Oscar, dois Globos de Ouro e um prêmio de melhor atriz em Cannes. Muita gente ainda diz que ela roubou esses prêmios de atrizes mais talentosas (eu estou entre esses que não são grandes fãs), mas não dá para negar o peso da filmografia de Cher. 



1 - Frank Sinatra
Melhor momento: A Um Passo da Eternidade

Praticamente o primeiro cantor a trilhar os passos de ator, o genial Sinatra se revelou tão espetacular atuando quanto cantando. Essa foi apenas mais uma das tendências que Sinatra deu início, e por sua atuação em A Um Passo da Eternidade ele ganhou o Oscar e o Globo de Ouro de melhor ator coadjuvante. Ele realmente ainda é o homem a ser batido nesta lista.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Análise: Um Método Perigoso

Eu vou começar essa resenha de forma direta e um tanto quanto bombástica, porque considerando seu teor altamente contraditório, não há outra maneira de fazer isso. Eu já vi alguns filmes de David Cronenberg, não todos, mas uma boa parte, o suficiente para dizer o que vou dizer agora: Um Método Perigoso, seu último filme, que chega ao Brasil com quase um ano de atraso, é o pior de sua filmografia. Não, ele não é nenhum desastre. Pelo contrário, suas características positivas superam as negativas. Seu maior pecado, porém, é ser convencional demais, não ousar, se manter colado demais ao padrão, ainda que seja fruto justamente de um diretor que é famoso por não gostar de chegar nem perto de nada disso. Apesar disso, e contraditoriamente como eu já avisei que essa resenha seria, o filme ainda assim é altamente assistível, e um trabalho de forte atuação.

A trama, baseada em uma mistura de fatos reais e suposições amplamente aceitas pela história, mas com muitos detalhes ainda desconhecidos, narra a amizade de Carl Jung (Michael Fassbender), o pai da psicologia analítica, e Sigmund Freud (Viggo Mortensen), o pai da psicanálise. Jung e Freud tiveram uma relação primeiramente construída sobre uma base de admiração, mas que foi gradualmente se deteriorando em função das divergências entre esses gênios do século XX, tanto no campo das ideias quanto em aspectos mais pessoais. Entremeando essa amizade está o relacionamento de Jung com Sabina Spielrein (Keira Knightley), uma mulher inicialmente diagnosticada como histérica que acaba sob os cuidados do psiquiatra. Jung tratou de Sabina, transformando-a em sua paciente modelo, e estimulou a paciente a seguir o caminho da psiquiatria, fazendo com que ela se tornasse uma das primeiras mulheres a se destacar na área. Contudo, o relacionamento de ambos rapidamente evoluiu para algo mais, apesar de Jung ser casado, o que escandalizou a comunidade científica da época.

Mantendo-se bastante fiéis ao que é conhecido historicamente, nem Cronenberg nem o roteiro de Christopher Hampton procuram correr riscos. Bem diferente disso, o diretor canadense entrega seu trabalho mais "modelo clássico", com roteiro amarradinho (mas com algumas ótimas tiradas e diálogos potentes) e estrutura extremamente convencional. Essa incapacidade de ir além do filme incomodou particularmente pela mistura de um tema promissor com a presença de um cineasta ousado e talentoso, mas não chega a comprometer o filme como um todo. Apenas, porém, faz com que ele não ganhe um ar de "memorável" ou mesmo não perdure por mais tempo na cabeça do espectador. Ao dizer isso, não quero insinuar que o filme deveria obrigatoriamente cair na predileção pelo bizarro e por estéticas perturbadoras de Cronenberg. Ele já provou que pode fazer muito bem enredos mais mundanos, mas ainda assim impactantes com Marcas de Violência e Senhores do Crime. Esses exemplos, porém, mostram sua capacidade de fazer algo mais em argumentos mais pé-no-chão.

Dessa forma, o grande trunfo do longa está em suas atuações. Se Michael Fassbender, um excelente ator, não entrega seu papel mais impressionante, ele ainda cria um Jung crível e interessante. A atuação de Keira Knightley talvez divida opiniões por seu embasamento (na primeira parte do filme) em tiques histéricos e no próprio exagero característico dessa condição, mas eu particularmente gostei. Contudo, quem se destaca é Viggo Mortensen, sem medo de imprimir uma marca pessoal em seu personagem, fazendo um Freud de características próprias. Há ainda uma participação rápida e competente de Vincent Cassel como o psicoanalista e maluco-não-tão-beleza Otto Gross. Como um todo, o filme entretém e chega a seu objetivo, mas não me surpreenderei se daqui há alguns anos ele se transformar em obra renegada pelos fãs extremos de Cronenberg. Para o resto do público, em especial, os fãs de enredos com grandes dilemas psicológicos, a conferida pode valer a pena.

Nota: 3,5 de 5,0.

domingo, 1 de abril de 2012

Top 10: É mentira!

Datas especiais costumam inspirar postagens nesse blog, como vocês já devem ter percebido. Enquanto pela internet afora 1º de abril costuma ser uma data perigosa para circular por alguns sites (às vezes as brincadeiras acontecem até mesmo onde você menos espera), no cinema o tema da mentira costuma render bons filmes e uma boa diversão. Em algumas situações, a mentira é leve, mas traz grandes consequências. Em outras, a mentira é um crime ou acoberta um, e a trama não tem nada de tom brincalhão. Qualquer que seja o caso, o tema já é aproveitado a décadas e já rendeu até um documentário (?) de um dos maiores cineastas de Hollywood. Hoje, você confere aqui uma seleção dos melhores filmes sobre mentira.

10 - Os Picaretas
Diretor: Frank Oz / 1999

Steve Martin interpreta um produtor de cinema que tem o desejo de criar um grande sucesso, para o qual ele economizou por toda sua vida para juntar verba. Como o capital acumulado não é lá grande coisa - 2,184 dólares -, ele e sua equipe armam um plano de fazer com que um grande astro de Hollywood, interpretado por Eddie Murphy, atue no filme sem saber realmente que está participando de uma produção. Para isso, eles fazem com que atores interajam com o astro na rua, numa trama que simula uma invasão extraterrestre. O problema é que o ator é membro de uma seita exótica (paródia não-oficial da Cientologia) e passa a acreditar que a invasão é real.

9 - True Lies
Diretor: James Cameron / 1994

Nessa mistura de comédia com ação, Arnold Schwarzenegger é um agente secreto de contra-terrorismo americano. Sua profissão o obriga a esconder a verdade de sua esposa, interpretada por Jamie Lee Curtis, que acredita categoricamente que seu marido é um vendedor de computadores. O tédio do casamento faz com que ela passe a ver outro homem, mas as mentiras da vida do casal caem por terra quando eles acabam raptados por um terrorista que o marido estava perseguindo.


8 - Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas
Diretor: Tim Burton / 2003

Will Bloom (Billy Crudup) sempre acreditou que seu pai, Edward (Albert Finney) era um mentiroso por causa das histórias de sua juventude que ele contava. Depois de muito tempo afastado, ele volta a encontrar o pai quando este está em seu leito de morte. Disposto a entender melhor aquele homem, Will aceita ouvir as histórias do homem, cuja versão jovem é interpretada por Ewan McGregor. Com vários toques de fantasia, esse é provavelmente o filme mais bonito de Tim Burton.


7 - F for Fake
Diretor: Orson Welles / 1974

Em estilo de documentário, mas com um roteiro que mistura fatos com ficção, Orson Welles explora o tema da mentira e cita ao longo do filme personalidades como Howard Hughes, Pablo Picasso e o falsificador de quadros Elmyr de Hory, cuja trajetória é o pontapé inicial do filme. O filme, por si só, é marcante por basicamente não se encontrar paralelos em termos de narrativa em qualquer lugar na história do cinema. Além disso, é o penúltimo filme dirigido por Welles, que por toda sua carreira brincou com a oposição de verdade e mentira, inegavelmente sua marca registrada.

6 - Um Golpe de Mestre
Diretor: George Roy Hill / 1973

Situado na década de 1930, esse ganhador do Oscar de melhor filme mostra uma mentira sendo utilizada como a raiz de um golpe. Aqui, dois golpistas, interpretados por Robert Redford e Paul Newman, se unem para passar a perna em um mafioso de Chicago (Robert Shaw). Usando nomes falsos, eles se infiltram no círculo de confiança do mafioso, que não desconfia que um deles já aplicou um golpe anteriormente em um de seus homens de confiança, fazendo-o perder muito dinheiro.

5 - O Talentoso Ripley
Diretor: Anthony Minghella / 1999

Matt Damon é o Ripley do título, um jovem que ganha sua vida com golpes e mentiras. Ao conhecer um milionário, ele se faz passar por amigo de seu filho (Jude Law), um estudante de Princeton, e ganha muito dinheiro do ricaço para viajar para a Itália e convencer o filho, de quem Ripley finge ser amigo, a voltar para os Estados Unidos. No país europeu, Ripley começa a se insinuar na vida do jovem milionário e de sua namorada (Gwyneth Paltrow) com mais mentiras, que acabarão conduzindo a história a um final imprevisível e drástico.

4 - Adeus, Lenin!
Diretor: Wolfgang Becker / 2003

Nessa dramédia alemã, uma alemã fervorosa adepta da causa comunista entra em coma após um confrontamento com a polícia, pouco tempo antes da queda do Muro de Berlim. Quando ela enfim acorda, os médicos contam a seus filhos que outro choque poderá ser fatal para ela. É então que seu filho Alex (Daniel Brühl) passa a esconder a todo custo da mãe debilitada, com ajuda da irmã e da namorada, a derrocada do comunismo. Um filme divertido e emocionante.


3 - Prenda-Me Se For Capaz
Diretor: Steven Spielberg / 2002

O filme conta a história real de Frank Abgale Jr., interpretado por Leonardo DiCaprio, filho de um empresário com problemas (Christopher Walken). Fugindo da deterioração da família, na década de 1960, Frank começa a dar golpes falsificando cheques, o que logo chama a atenção do agente do FBI Carl Hanratty (Tom Hanks), que passa a seguir os rastros do jovem. Enquanto isso, Frank se especializa cada vez mais em seus golpes, e suas mentiras ficam cada vez mais complexas, até que ele conhece e se apaixona por uma filha de luteranos radicais (Amy Adams).

2 - Fargo
Diretor: Joel e Ethan Coen / 1996

Com problemas financeiros e cheio de dívidas, um vendedor de carros (William H. Macy) arma um plano ousado e contrata dois criminosos para sequestrar a própria esposa, com a intenção de fazer com que seu sogro, um empresário que o odeia, pague um resgate milionário. O plano começa a dar errado, porém, quando o sogro decide agir de seu próprio jeito e uma policial caipira, mas durona (Frances McDormand), começa a investigar assassinatos cometidos por um dos sequestradores. Talvez o mais impactante filme dos respeitados irmãos Coen.

1 - Curtindo a Vida Adoidado
Diretor: John Hughes / 1986

Esse clássico da Sessão da Tarde é provavelmente uma das melhores comédias já produzidas. Seu protagonista, Ferris Bueller (Matthew Broderick), é um estudante do ensino médio que conta uma mentira clássica para seus pais: a de que está muito doente para ir para a escola. Ganhando o dia livre, ele convence sua namorada e seu melhor amigo a passear por Chicago antes que o ensino médio acabe e eles se separem. Mas, para isso, precisará manter a farsa da própria família e do inspetor da escola. Um filme leve, de trama despretensiosa e que funciona muito bem - tanto que conquistou uma legião de fãs.