O cerne da trama é simples: Pi (Irrfan Khan), um indiano dono de um zoológico no Canadá, conta a um escritor a respeito dos 227 dias que sobreviveu sozinho como náufrago em um barco após um naufrágio que matou sua família, tendo como única companhia um tigre-de-bengala, animal do zoológico de seu pai, quando tinha 16 anos (interpretado pelo estreante Suraj Sharma). Sobreviver à natureza, como Pi logo percebe, é apenas parte do problema, já que o isolamento e a solidão cobram um preço bastante alto por sua presença indesejada e a linha entre realidade e ilusão começa a se desfazer cedo demais.
Porém, sob essa superfície, mas não exatamente ocultos, estão temas relativos à natureza humana que se tornam altamente pertinentes e significativos conforme o filme avança para seu desfecho. A essência e a importância da religião são o tema que salta primeiro aos olhos - o escritor procura Pi em busca de uma história que o inspire a acreditar em Deus -, contudo também se faz presente uma discussão, de maneira sutil e impressionante, sobre os limites do ser humano e sua capacidade de sobreviver, reerguer e recomeçar, mesmo após a maior das tragédias. De certo modo, alguém poderia dizer que, além disso tudo, As Aventuras de Pi é um história de como contar uma história. Essa interpretação provavelmente está tão certa quanto todas as outras. No final, a mensagem que fica é bastante diferente daquela que você poderia esperar no começo, mas é sem dúvida uma das mais importantes e relevantes dos últimos tempos.
A direção de arte e a fotografia de Claudio Miranda são responsáveis por dar vida e versatilidade a um cenário que por cerca de 70% do filme se resume a um barco e ao oceano. Unidos, formam um milagre cinematográfico. Os efeitos especiais são provavelmente os melhores do ano, com destaque para a cena do naufrágio e claro, o impressionante tigre de CGI, uma das criações mais verossímeis da computação gráfica para cinema. Tecnicamente impecável e indicado a 11 Oscars (filme, direção, roteiro adaptado, fotografia, montagem, efeitos especiais, mixagem de som, edição de som, design de produção, trilha sonora e canção), As Aventuras de Pi coroa em especial o talento de duas pessoas: Suraj Sharma, olhos, ouvidos, corpo e coração de Pi. Ainda que sua performance não tenha sido um reconhecimento universal, injustamente, ele segura com mérito e basicamente sozinho a missão de levar às câmeras até a mais sutil das emoções da história. O outro destaque, claro, é Ang Lee e sua direção sempre competente. Ele não tenta revolucionar a maneira de fazer cinema aqui (Em O Tigre e o Dragão suas "brincadeiras" são mais explícitas, por exemplo), porém é justamente a simplicidade da proposta o que a torna especial. O produto final é um filme esplendidamente realizado e, possivelmente, um dos mais bonitos dos últimos tempos.Nota: 5,0 de 5,0.


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