"Termômetro para o Oscar". Esse slogan informal é atribuído há muito tempo ao Globo de Ouro e é bem provável que muita gente tenha assistido à cerimônia da premiação ontem tentando traçar paralelos com o que provavelmente acontecerá dia 26 de fevereiro, data da entrega do Oscar. Quem teve essa intenção, com certeza terminou a noite com mais perguntas do que respostas. Também pudera: se olharmos as principais categorias - filme de drama, filme de comédia, diretor e roteiro -, veremos que cada prêmio foi para um filme diferente. Claro, uma premiação de cinema não precisa se ater a um único filme e a diversidade é sempre bem-vinda, mas alguma coesão é fundamental para mostrar que realmente foi possível identificar um certo número de "melhores do ano". E a sensação que ficou foi a de que quem votou no prêmio ontem não sabia muito bem o que estava fazendo. Não que os vencedores tenham sido injustos, mas parece que estamos diante de um ano particularmente estranho e desconexo quando o assunto é temporada de premiações.
Antes de fazermos uma análise dos vencedores em si, vamos começar desmentindo a frase que abre essa postagem. O Globo de Ouro NÃO é termômetro para o Oscar. É só olhar os últimos dez anos da premiação: dos dez vencedores de melhor drama e dos dez de melhor comédia, apenas três acabaram levando o Oscar de melhor filme: Chicago, O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei e Quem Quer Ser Um Milionário. E os dois últimos foram casos de vencedores "inquestionáveis", aqueles filmes que venceram absolutamente todas as premiações do ano, o que quer dizer que o Globo de Ouro foi só mais um na onda e não um prognóstico. E, no geral, o Oscar tende a dar mais bolas dentro do que o Globo de Ouro. É só olhar: Bugsy vencendo O Silêncio dos Inocentes? Perfume de Mulher ganhando de Os Imperdoáveis? A Garota do Adeus derrotando Noivo Neurótico, Noiva Nervosa? É claro que nem tudo é demérito para o Globo de Ouro: eles também acertam bonito às vezes. E tendem a ter uma boa taxa de correspondência com o Oscar nas categorias de atuação. O truque é encarar o Globo de Ouro como algo a parte, uma premiação que não deve ser considerada muito seriamente, mas ainda garante alguma diversão.
Tendo dito isto, vamos aos vencedores e comentários:
- Melhor filme de drama
Vencedor: Os Descendentes
O que isso nos diz: Basicamente, nos prova finalmente que Os Descendentes tem uma base de fãs por aí e que é talvez o único real concorrente a O Artista no Oscar. Ainda assim, não consigo ver o filme ganhando a estatueta. O filme tem cara de anos 80: tivesse sido lançado na mesma época que Kramer vs. Kramer, Gente como a Gente ou Laços da Ternura, seria o favorito disparado. Mas os Oscars mudaram e muito de lá pra cá. Pode chegar lá, mas me surpreenderia.
- Melhor filme de comédia/musical
Vencedor: O Artista
O que isso nos diz: Apenas nos prova que O Artista é um dos grandes favoritos. Ganhar nessa categoria não foi difícil - ele era o vencedor óbvio. Mas ainda não consigo ver qualquer filme ganhando o Oscar que não seja ele.
- Melhor diretor
Vencedor: Martin Scorsese, A Invenção de Hugo Cabret
O que isso nos diz: É aí que a coisa se complica. A vitória de Scorsese nos mostra que A Invenção de Hugo Cabret tem mais apoio do que muita gente pensava. Isso parece apontar para uma divisão na premiação do Oscar: enquanto Scorsese tem chances de ganhar, seu filme nem tanto, o que é bastante estranho, pensando-se logicamente. Ainda aposto em Hazanavicius para o Oscar, mas parece que estou começando a nadar contra a corrente.
- Melhor roteiro
Vencedor: Woody Allen, Meia-Noite em Paris
O que isso nos diz: Já não estava bastante complicado? O roteiro de Allen, como todos da carreira do diretor, é original (em todos os sentidos), na terminologia do Oscar. Supondo-se que ele vá tirar o prêmio nessa categoria de O Artista, e realmente tudo está indicando para isso, sobra Roteiro Adaptado, que até agora aponta para Os Descendentes. E me parece estranho que O Artista possa ganhar Melhor Filme sem prêmios para seu diretor ou seu roteiro. Logo, chegamos aqui a dois desdobramentos: ou O Artista não leva o Oscar, ou o cenário do Globo de Ouro não vai se repetir no seu primo mais famoso, o que eu particularmente acredito ser o caso.
- Melhor ator de drama
Vencedor: George Clooney, Os Descendentes
O que isso nos diz: Que Clooney vai ganhar o Oscar. Alguns ainda acreditam em Brad Pitt, mas acho que cada vez mais as chances dele perdem força. Ele precisa do SAG dia 29 e ainda assim seria uma competição apertada.
- Melhor atriz de drama
Vencedora: Meryl Streep, A Dama de Ferro
O que isso nos diz: Que Streep de fato é a favorita e deve ganhar seu terceiro Oscar. As chances de Viola Davis não acabaram - um SAG dia 29 empata a disputa - mas está tudo apontando para Streep. Talvez sua grande competidora nem seja Davis, mas sim Michelle Williams.
- Melhor ator de comédia/musical
Vencedor: Jean Dujardin, O Artista
O que isso nos diz: Honestamente, nada. A vitória dele era óbvia pelo favoritismo do filme. Ele pode ganhar o Oscar numa total surpresa, mas não se iludam com o fato de que, se isso acontecer, a vitória dele aqui foi o primeiro sinal.
- Melhor atriz de comédia/musical
Vencedora: Michelle Williams, Sete Dias com Marilyn
O que isso nos diz: A vitória de Williams aqui também não foi surpresa. Ela muito provavelmente vai ser indicada ao Oscar e talvez seja a mais bem posicionada para competir com Streep pelo Oscar pela força de sua personagem.
- Melhor ator coadjuvante
Vencedor: Christopher Plummer, Toda Forma de Amor
O que isso nos diz: Que Plummer já pode abrir um espaço na estante para o Oscar.
- Melhor atriz coadjuvante
Vencedora: Octava Spencer, Histórias Cruzadas
O que isso nos diz: Bem, Spencer se tornou oficialmente a favorita da categoria. Porém, eu ainda tenho uma sensação que ela não vai ganhar o Oscar. Não tenho qualquer coisa para basear isso, é puro achômetro. Não acho que seja preconceito racial - mulheres negras ganham essa categoria com alguma frequência, até. Mas ainda me parece que falta "algo". Se ela ganhar o SAG, mudo oficialmente de opinião.
Ah sim, O Artista ganhou trilha sonora, algo que deve se repetir no Oscar. E não vamos comentar a respeito de Madonna ter ganhado Melhor canção, prefiro fingir que isso não aconteceu. Vamos apenas nos ater o fato de que a canção está inelegível para o Oscar e agradecer por isso. Já o iraniano A Separação ganhou filme estrangeiro, como tem ganhado em todas as premiações. A vitória de As Aventuras de Tintim como Melhor animação surpreendeu a alguns, mas apenas prova que o filme superou a discussão quanto a ser ou não um desenho animado e ultrapassou Rango como o favorito ao Oscar. Quanto à cerimônia em si... bem, ela começou até que bastante bem, mas terminou bastante corrida, com a impressão de que eles não poderiam ultrapassar o horário estipulado de jeito nenhum. No mais, bastante burocrática e com pouca emoção, com exceção talvez, da homenagem a Morgan Freeman. Ah, e Gervais estava bem mais controlado dessa vez também, e foi só chato. Mas tradições são tradições, afinal.
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