terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Análise: Os Descendentes

Alexander Payne é um dos diretores indies queridinhos de Hollywood. Tendo construído uma carreira sólida na década de 1990 com seus filmes pensados para circuitos menores, mas que conseguiram atrair relativa atenção, foi em 2002 com As Confissões de Schmidt que Payne conseguiu abrir de vez as portas do sucesso de público e crítica. Isso, porém, não modificou o estilo do diretor. Assinando com a Fox Searchlight - divisão do famoso estúdio de cinema voltada para os filmes independentes -, Payne lançou Sideways em 2004, filme que conquistou praticamente todos os prêmios da crítica naquele ano. Nada menos que sete anos depois, o diretor lançou seu quinto longa, Os Descendentes. Não demorou muito para o filme começar a chamar atenção, em especial pela atuação de George Clooney no papel principal. O filme ganhou o Globo de Ouro de Melhor Drama e bem recentemente foi indicado para cinco Oscars. Como todos os filmes de Payne, Os Descendentes é uma dramédia, onde questões tipicamente existencialistas são discutidas com toda a leveza que o roteiro puder oferecer. Mas a pergunta que fica é: o longa consegue satisfazer as expectativas e agradar? Para mim, a resposta é direta: Os Descendentes pode não ser melhor do que Sideways, mas sim, Payne mais uma vez entrega um excelente filme.

Clooney é Matt King, um advogado de raízes havaianas que recebeu, junto com seus primos, uma gigantesca herança na forma de terras do arquipélago mais famoso do mundo. Matt é o único na família que realmente cuida dos negócios referentes às propriedades e tem poder soberano para tomar qualquer decisão a respeito delas. Logo fica claro que ele é um workaholic que tem grandes dificuldades para lidar com suas filhas, Alexandra (Shailene Woodley), de 17 anos, e Scottie (Amara Miller), de 10. O filme apresenta desde o começo o drama que mudou o rumo da vida de Matt completamente: sua esposa sofreu um acidente de lancha e está em coma, desenganada pelos médicos. Mais do que lidar com o sofrimento da perda iminente de sua esposa, Matt precisa arranjar um jeito de se conectar com suas filhas: Alexandra alienou-se completamente da família e Scottie está se tornando uma criança cada vez mais problemática. Para piorar, Matt descobre por meio de Alexandra que sua esposa o estava traindo com um corretor (Matthew Lillard) e planejava pedir o divórcio. Ele então toma uma decisão ousada: decide procurar o amante de sua mulher para avisá-lo de que ela está morrendo - e para tentar entender como sua vida desandou tão completamente.

Os Descendentes é mais uma mostra de como Payne é um roteirista de primeira, sabendo equilibrar perfeitamente momentos de calma e humor com passagens intensas e de rasgar o coração. O filme é um drama familiar, antes de tudo, uma dissecação de uma família disfuncional que não deixa de ter laços de afeição entre si - apenas os seus nós que foram se embolando cada vez mais com o passar dos anos. Matt percebe que para entender como poderá ser capaz de seguir em frente após a tragédia, ele precisará primeiro identificar os erros do passado e remendar os pedaços de sua vida. Mas ele logo descobrirá também que muitas vezes não é nada fácil dizer adeus.

É preciso ressaltar, antes de terminar, o grande trabalho do elenco. Já ouvi e li em alguns lugares que talvez a atuação de Clooney não fosse digna de tantos elogios, que ele afinal só estaria interpretando ele mesmo na  grande tela. Não se deixe enganar: Clooney abraça Matt King e dá vida própria a ele. Todos seus maneirismos, sua atenção aos menores detalhes, até mesmo o jeito como ele faz seu personagem correr funcionam para criar um homem abalado e buscando forças em todos os lugares extremamente crível. Clooney está sim na atuação de sua carreira e merece os elogios e premiações que vierem. Quem também faz bonito é Shailene Woodley. A química entre ela e Clooney na tela é notável e Woodley não se intimida diante do veterano. Sua cena na piscina é um dos momentos mais notáveis do filme - com uma grande ajuda da fotografia, também. Pena que a montagem de Kevin Tent, que já teve melhores momentos, deixe um pouco a desejar em várias situações, caindo excessivamente no convencional (só o hype do filme no Oscar justifica sua indicação nessa categoria, mas enfim). Detalhes por detalhes, Payne cumpriu sua missão de entregar um filme que cumpre seus objetivos e entretém. Vale a conferida.

Nota: 4,5 de 5,0.

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